Não foi bem hoje, mas foi tão recente que a mentira passa como comestível.
Gerrit Komrij realizou três de meus sonhos: ser holandês, escrever poesia e ir morar nos Trás-os-Montes.
Segue um poema, na tradução do escritor Fernando Venâncio, meio às avessas do Gerrit em que, nado em Portugal, hoje tem nacionalidade holandesa.
Máscaras
O homem com a máscara brincando
Até chegar a hora em que o seu rosto
Partilhava com ela uma só vida:
Já miúdo a história me punha indisposto.
Negava-me a aceitar. Quando crescesse,
Ia mostrar que outra maneira havia:
Que cada máscara, sem dor ou risco,
Como um capuz tirar-se podia.
Fiz disso muito tempo um firme credo.
Escondi, confiante, a minha natureza.
Extinto o fulgor do jogo que eu fazia,
Teria ela a original pureza.
Hoje sou velho, só para admitir:
A história é real. A máscara agarrou-se.
É como habituares-te ao inferno.
Como se olhar vazia cova fosse.
Gerrit Komrij (30.03.1944 - 05.07.2012)