Sunday, July 31, 2022

Chão de Estrelas II

Vila Kosmos

Alguns achados recentes. Juro que tinha um de Benfica por aqui, mas não acho. Mas a messe, relevem o elogio em blog próprio, é boa e vale por inaugurar a tag 'piso de caquinhos'

O Chão de Estrelas I está aqui :: ' Tu pisavas nos astros distraída'


Vila Kosmos

Vila da Penha

Penha

Engenho de Dentro
           

Azulejos em Amsterdam :: Distel



Não, não são os Delft, em Amsterdam facilmente encontráveis à venda, antigos ou fresquinhos. Refiro-me aqui a esses que descobri por acaso, andando principalmente pela parte sul da cidade, dispostos na entrada daqueles pequenos prédios vermeerianos, ladeando a porta. Já me dava por satisfeito com eles, alguns esmaltados, mas eis que depois vieram frisos art nouveau a que se seguiram ainda  dois lindos painéis. Nestes, de quebra, a assinatura no canto inferior direito revelou o segredo: Distel. Trata-se da De Distel, fábrica de cerâmica fundada em 1895 e muito requisitada e premiada nos primeiros decênios do século XX. Em Distel desenvolveu-se a técnica carduus, por sua vez inspirada na corda seca. Um achado, um tesouro 

 










 






Thursday, July 28, 2022

Com Sylvia pelas ruas geladas de Londres

 

 

Os dezoito minutos finais de Sylvia (2003) são dolorosos. Bonitos, dolorosos. Na sequência de cenas doídas (suas conversas com o vizinho, o abandono frio e definitivo de Ted, suas alucinações no corredor, a preparação para a morte), há aquela em que ela caminha pelas ruas geladas de Londres. Ninguém pode fazer-lhe companhia, trocar palavras ou silêncios. Ela caminha com olhos insistentes e desesperançados, fixa o vazio que em breve irá abraçar. A música de Gabriel Yared é a trilha perfeita e quando, há muitos anos, pedi que meus alunos atendessem à notação de Tennessee Williams de que a música para sua The Glass Menagerie fosse 'perhaps the saddest music', foi esta que eu trouxe

Foi assim, foi exatamente assim, que caminhei com o Dante em Petrópolis, na véspera do meu aniversário deste ano

Nós saímos de um restaurante, onde ele estivera muito, muito mal. Meltdown, TAG, expressos em seu obsedante bater de cabeça, nas costas da cadeira, na mesa, na parede. Foi assim por todo o final de semana, dos piores. Nós saímos do restaurante, eu frustrado, exausto, impotente. Caminhamos numa estrada em que não havia calçada, caminhamos contra os carros. Por um momento pensei que se um daqueles carros nos colhesse, ao menos seria o fim de tudo. Eu pensei isso

Logo em seguida a esta cena de que falei, Sylvia entra numa cabine telefônica e procura algum contato, uma ajuda. Mas a pessoa não pode se encontrar com ela. Em seguida ela liga para seu médico, a quem diz "I can't manage". Caramba. Foi exatamente o que eu disse quando por esses dias me perguntavam, alguns realmente interessados, outros apenas faticamente, 'Não estou dando conta, não'. A reação que recebi ao meu desabafo desesperado foi, também aqui, a mesma em alguns casos: a indiferença

E ai de quem, e ai de mim, reclamar dessa indiferença. Se transforma em raiva.




Poema

 


Os anos caminham em teu rosto
na forma de traços que se unem e multiplicam
Já na testa um hexagrama de I Ching
que procuras decifrar sob a luz quente do espelho
 
Levantar às cinco não altera nada
Possivelmente morta a pretensão que tinhas
De sair da vida mais jovem
do que quando chegaras

Friday, July 22, 2022

Cervejaria De Prael :: Inclusão

 

Minha vontade de visitar a cervejaria De Prael vinha de anos. Não sei precisar de que ano, mas sim de que momento: quando soube que empregavam apenas pessoas com histórico de questões mentais. Isso me cativou. Se nunca esqueci que o Lonely Planet dizia (isso também há muitos anos): "Se você tiver tempo para uma única visita em Amsterdam, vá à casa de Anne Frank", agora adiciono "E tome sua cerveja na De Prael. Se sobrar tempo, aí sim faça a Heineken Experience"

Fosse aqui no Rio de Janeiro, não durava um ano. Em Amsterdam cresceu, abriu filiais. Fomos na do centro, onde fabricam as birras mesmo. Ao contrário da maioria dos espaços da cidade, é amplo. Amplo e aconchegante

Soube depois que empregam também ex-presidiários, o que reforça seu slogan. All in all, uma experiência maravilhosa. Ah, as cervejas muito boas também. Em país de gigantes internacionais, Amsterdam tem um cena de artesanais fabulosa

  Com o Ulysses, ex-aluno, hoje amigo e amsterdamer

Risottodjik : Risoto Holandês com Queijo de Cabra Trufado e IPA com Lascas de Tamanco

 






Famosa por seus pintores, canais, cannabis, moinhos, tulipas e laranja mecânica, a Holanda não será lembrada por sua culinária. Com efeito, quem aqui já foi num restaurante típico... holandês? Não existe e, quando em Amsterdam, trate de aproveitar os indonésios (o rijsttafel!) e os surinameses

Talvez por isso tenham se lançado aos mares: sem culinária decente, vão procurar coisas gostosas ao redor do mundo. O caso da Inglaterra mais que comprova essa tese

Pensando nisso, com atraso de alguns séculos, inventei hoje um risoto holandês, com queijo Edam de cabra trufado e uma IPA que recebe lascas de madeira usada para fazer os famosos tamancos. O arroz usado foi o carnaroli, não se pode ter tudo

 


Thursday, July 21, 2022

Para se conhecer o Progressivo Holandês

Talvez pequena contradição aqui: a banda de rock progressivo estrangeira que mais vezes se apresentou no Brasil é de país cuja cena prog está longe de ser das mais prolíficas. Enquanto qualquer fã do gênero cita sem delongas cinco bandas alemães, italianas e inglesas, na hora de citar cinco holandesas é provável que ele empaque no Focus (a tal da banda que mais se apresentou) e peça cola ao google. Ou ao progarchives. A não ser, claro, esse fã seja um Marra, um Pizzato, um Munhoz, um Paiva, um Moura, um Ed, quem sabe até um von Sydow

Tendo voltado ontem de Amsterdam, animei para fazer minha lista básica. Como toda lista progressiva que se preze, é variada, indo do hard de Brainbox e Cargo, passando pelo canterbury do Supersister, pelo folk do Fungus, pelo orquestral-teatral do Groot e chegando ao sinfônico do Earth and Fire, Focus e Kayak. O Golden Earring não é propriamente banda prog, mas esta música é progressiva até a medula. São todas dos anos 70, com exceção de uma

Lamentável que quase banda nenhuma do país de Vermeer cante em holandês. As duas únicas exceções da lista são o De Groot e a Fungus, banda folk que está para a Holanda como Malicorne para a França. Sequer consta do progarchives

Pra compensar, temos o Irolt que canta em frisão

Vai de bônus a "Driving to Amsterdam", por afinidades óbvias e por ser Khan

 

"Dark Rose" (1969) -- Brainbox

"Heksensabbat deel Vier" (1969) -- Boudewijn De Groot 

"Song of the Marching Children" (1971) -- Earth and Fire

"Judy Goes on Holiday" (1972) -- Supersister

"Cross Talking" (1972) -- Cargo

"Love Remembered" (1973) -- Focus 

"Vanilla Queen" (1973) -- Golden Earring

"They Get to Know me" (1974) -- Kayak

"Paradoxical Moods" (1975) -- Finch

"De Gudrun Sêge" (1975) -- Irolt

"Opus 1065" (1975) -- Trace

"Het Vrouwtje Van's Hertogenbosch" (1976) -- Fungus

"Arctic Skies" (2005) -- King Eider


BONUS TRACK

"Driving to Amsterdam" (1972) -- Khan



                                         









Wednesday, July 06, 2022

O Meu Exu de Cachoeira

Rubem Braga tem seu pé de milho, agora tenho eu meu Exu, "um ser vivo e independente". Comprei-o das mãos de seu artesão, Diego, cujo pai conheci, mesmo local, quando estive ali ás margens do Paraguassu, em Cachoeira, há coisa de trinta anos. Diego é evangélico. Mais que isso: é cantor gospel. Segue, porém, esculpindo seus orixás. A boiada critica, segue ele esculpindo seus lindos orixás, segue ferrenho anti-bolsonarista. Às margens do Paraguassu, do outro lado São Félix e a brisa como que perene

Comprei um Exu, seu pau ereto esmartemente destacável. No mesmo dia jantei com amiga na Casa de Tereza e plantei-o à nossa mesa. Voltando ao Grajaú, plantei-o à entrada de casa, como se fora ele um protetor à moda de Príapo de Pompéia. Que ele é, e mais que isso







Tuesday, July 05, 2022

Belém da Cachoeira, Bahia


É antiga minha paixão por distritos. E vilas e povoados, indicando que estão fora da sede do município, seja lá que município for. Há muitos anos escrevi aqui sobre o Bairro dos Souza, distrito de Monteiro Lobato, São Paulo. "Bairro".

Conhecer cidadezinhas é legal, mas o melhor é conhecer os seus distritos. A caixinha dentro da caixinha.

Poderia ser esta outra postagem aqui, sobre Pedras, tão significativa na toponímia roseana.

Agora Belém da Cachoeira. Cachoeira é cidade maravilhosa, voltar a ela foi melhor que a primeira vez. Que brisa é aquela que sopra do Paraguaçu, que casarões são aqueles, que azulejos? E, claro, ainda tem São Félix a uma ponte de distância

E um pouquinho antes: o distrito de Belém da Cachoeira, velho como o Morro do Pai Inácio. Um casario de sonho, os licores e, não bastasse tanto, a igreja em cujo seminário estudou ninguém menos que o Padre Bartolomeu de Gusmão, o Padre Voador, personagem da vida baseada em fatos reias e de outras vidas, tão mais reais, como quando ele sobrevoa os céus de Lisboa ao lado de Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas em sua passarola. De lá de baixo, chegavam-lhes aos ouvidos as notas do cravo de Scarlatti

Não tinham medo, estavam apenas assustados com a sua própria coragem. O padre ria, dava gritos, deixara já a segurança do prumo e percorria o convés da máquina de um lado a outro para poder olhar a terra em todos os seus pontos cardeais, tão grande agora que estavam longe dela, enfim levantaram-se Baltasar e Blimunda, agarrando-se nervosamente aos prumos, depois à amurada, deslumbrados de luz e de vento, logo sem nenhum susto, Ah, e Baltasar gritou, Conseguimos, abraçou-se a Blimunda e desatou a chorar, parecia uma criança perdida, um soldado que andou na guerra, que nos Pegões matou um homem com o seu espigão, e agora soluça de felicidade abraçado a Blimunda, que lhe beija a cara suja, então, então. O padre veio para eles e abraçou-se também, subitamente perturbado por uma analogia, assim dissera o italiano, Deus ele próprio, Baltasar seu filho, Blimunda o Espírito Santo, e estavam os três no céu, Só há um Deus, gritou, mas o vento levou-lhe as palavras da boca. Então Blimunda disse, Se não abrirmos a vela, continuaremos a subir, aonde iremos parar, talvez ao sol.