Tuesday, August 30, 2016

Os teus cabelos lentamente afago :: Soneto musicado



Pedro nunca foi aluno meu. Ele era de uma turma que me marcou muito e com quem tive pelo menos dois anos inesquecíveis. Mas ele fazia Francês. Depois que ele saiu do CAp, mantivemos contato pelo face, onde vi que ele começava carreira musical.

Aí ele musicou este soneto de 2013. Eu enviei para ele e, before you could say knife, ele me enviou uma primeira versão. 

O poema, ainda inédito em livro, é de época em que o Dante dormia mal e pouco, if ever.

Sobrevivemos. E mesmo mais que isso. Se calhar, soneto e canção provam-no.




Sunday, August 28, 2016

Gozando Junto XXIV ::: España

Segóvia


Poucas aqui, mas também foram poucos dias. E eu estava voltando à mania desta série. By the way, presenciar a cena acima foi das coisas que me fizeram retomar este projeto de fotografar pessoas fotografando (-se).

Madri

Segóvia

Segóvia

Toledo

Toledo

Saturday, August 27, 2016

Crônicas Marroquinas VIII ::: Os Mosaicos de Volubilis e Uma Questão



Apreciar os mosaicos de Volubilis, cidade romana em Marrocos do século III D.C., trouxe-me antes de mais nada, emoção imensa. A maioria deles é de mosaicos figurativos e, ainda que muitas vezes já desgastados e esmaecidos pelo tempo, falamos aqui de quase dois mil anos, a sensação de movimento que transmitem, aliada à mística de sua enorme longevidade, lembrou-me um poeta latino do século VI, por sinal escrevendo acerca dos mosaicos de Ravena : Aut lux hic nata est aut capta hic libera regnat :: "Ou a luz nasceu aqui, ou, aqui aprisionada, reina livre".

Conforme escrevi acima: "desgastados e esmaecidos pelo tempo". Os mosaicos ali são os verdadeiros mosaicos, construídos, tessela a tessela, pelo artista do ano 217, seja para uma piscina, seja para um pátio, seja para um átrio. Que o mosaico que hoje eu veja seja exatamente o mosaico visto pelo volubilense de quase 2 mil anos é, para mim, garantia de um frisson a mais, cereja no bolo da apreciação estética em si.

Saramago teria ficado doudo. Em seu maravilhoso Viagem a Portugal, indigna-se com uma imagem de N. Senhora original, exposta às intempéries do tempo numa esquina de Braga. Clama que ela seja colocada na segurança de um museu e ali, na esquina bracarense, seja posta uma réplica, de modo a protegê-la das intempéries. Os mosaicos de Volubilis sofrem não apenas sol causticante e chuva, mas as consequências de um turismo de massa, o que inclui flashes, pisadas, lanhadas.

Sobre os profetas de Congonhas paira a mesma polêmica, que creio ser comum em muitíssimos outros locais.

Eu, romanticamente pensando, tendo a preferir o original ali. Ver o que os seus contemporâneos viram. Mas reconheço que a questão não pode se esgotar nisso. 

















Friday, August 26, 2016

Um Morto como eu deve ter sede



Em antiga antologia de Audálio Alves, que já me valera uma epigrafe para a exposição "Por dentro e por fora, menino", encontro por acaso a 'legenda' para a foto acima, tirada no último dia em Fez, perto do relógio d'água.

Um morto como eu deve ter sede:
Dai-me a água, azul ou fria,
Que restar dos pássaros.
Deve ter fome: dai-me rosas.
Um morto como eu deve estar sempre,
Intimamente alegre como os rios,
Ou aparentemente, de véspera, dormindo.

'
epitáfio oriental'

O Dia em que Shostakovich enganou Stalin, a Morte e a mim



Como é de regra, comecei com Shostakovich pela Quinta: foi sua primeira sinfonia que comprei depois de tê-la ouvido na Rádio MEC numa noite de domingo em 1985. Claro que me apaixonei, paixão que resistiu e resiste ao pendor que em algum momento de suas vidas os ouvintes de música erudita terão por 'música difícil' (no caso específico do Shosta, postei aqui há coisa de seis anos).

Depois da Quinta, eu queria mais e o disco que havia na Gramophone da 7 de Setembro era a Nona. A minha expectativa era enorme, tanto que até hoje não sei como desci no caminho para encontrar meu amigo João Ernesto no Salete e tomar chopp com as impagáveis empadas.

A audição, enfim, causou-me grande decepção. E nem foi só a história de estar tão acostumado com uma peça e estranhar de primeira uma outra (isso acontecia comigo até com Beatles, quando criança). Foi que eu esperava algo grandioso, fodástico, que retomasse o que Shostakovich deixara na Quinta. E olha que eu nem conhecia a Sétima. E olha que eu não conhecia nada da "maldição da Nona" (postei aqui ao falar de Philip Glass).

Claro que depois gostei um bocado dela.

Mas descobrir depois que ali o gênio russo enganou, em menos de meia hora, Stalin, a Morte e, de quebra, quarenta anos depois, um adolescente brasileiro ingênuo, só me faz achar essa sinfonia perfeita. Porque quando todos esperavam A Nona, a Nona das Nonas, estávamos em 1945, fim da guerra, Shosta nos sai com uma obra haydnesca, uma sinfonieta.

No vídeo que posto uma pequena correção: a passagem do quarto para o quinto movimento, feita toda ela no fagote solo, dá-se, in fact, aos 21:24. Só assim para tudo fazer sentido.

Posto também vídeo sensacional do Bernstein explicando toda a história desta Nona. Lembro-me de ter lido há muitos anos entrevista sua no Chicago Tribune afirmando desejo de ser enterrado com a Sétima do Shostakovich, dentre outras. Não foi. Foi "apenas" com a Quinta do Mahler. Mas o carinho dele pelo compositor russo era imenso.




Wednesday, August 24, 2016

Meu Revolver Faz 40 Anos



Desprezo numerologias (20 letras), mas aos 8 anos comprei por 88 cruzeiros na Rua Farias Brito 8 meu primeiro disco dos Beatles, aliás meu primeiro disco da vida, aliás dos Beatles.

Até esta manhã tentei sem sucesso, eu que nasci com prodigiosa memória, lembrar o que me fez querer um disco dos Beatles em 1976, aos 8 anos. Já escaneei o HD, revirei tudo na cabeça. Suponho que devo ter visto alguma coisa no Fantástico.

Meu pai, duro como ele só, deu a grana à minha mãe, que então certo fim de tarde, na volta do São José, estacionou o carro na Verdun com a exortação de que eu pedisse pro moço tocar as músicas antes para eu ver se gostava. Um de seus incômodos pedidos, como o de regatear preços nas lojas. Naturalmente não pedi o Revolver, mas um disco dos Beatles. Ele pousava a agulha no início das faixas do Lado A e eu, incomodadíssimo com tudo aquilo, meneava a cabeça mais para assustado que deslumbrado ou mesmo satisfeito. Foi como o sorvete de abacaxi do Drummond: ouvir ali sozinho no mundo dos adultos as tosses de "Taxman", as harmonias vocais e as cordas de "Eleanor Rigby", a eterna preguiça de John em "I'm only sleeping' e, o pior, a cítara de "Love you to", numa introdução que me soou infinita. Insuportavelmente infinita no começo da noite grajauense de 1976.

Foi amor à primeira vista? Ali na loja, não. Ou foi, aquele amor esquisito, perturbador e proibido, algo como deve ser amor homossexual que se sente lá pelos 10, 11 anos. O amor viria depois na audição intensiva e obsessiva que eu faria horas a fio, no manuseio incessante da capa. Aquilo não foi apenas o ingresso ao mundo adulto, mesmo porque adultos não estavam interessados em Beatles em 76. Aquilo foi o ingresso a outras paragens. Aquilo era meu.

Comprar um disco dos Beatles em 1976 fez de mim o que sou, para o bem e para o mal. Comprar um disco dos Beatles numa ditadura militar ainda forte, numa ditadura de gostos sempre implacável. O monstro avassalador da disco music ali na esquina e eu me renderia, sem jamais, jamais, renegar o amor primeiro, o amor maior, isto que me moldou.

Me pergunto como teria sido a história se o vendedor me tivesse apresentado o A Hard Day's Night. A mesma? Impossível dizê-lo. Só fui comprar outro disco dos Beatles um ano depois, em 6 de setembro de 1977, nas Lojas Americanas da Saens Peña. Esta ainda existe. A Ton & Ton da Farias Brito foi pro céu há muito, muitos anos antes da derrocada geral de todas as lojas de disco do planeta. Até recente o espaço era ocupado por um boteco (o detestável e previsível e gentrificado nome de Cantinho dos Amigos). Hoje encontra-se fechado, entre cabeleireiros e loja de umbanda, que essas não fecham nunca.


Escrevi 76 sobre a cabeça do John

Tuesday, August 23, 2016

Acaso existirão os marroquinos? Parte II ::: Com a Câmera nos Quadris



Juliana e Victor estiveram em Marrocos uma semana antes. Victor enfrentou a situação descrita nesta postagem aqui colocando a câmera à altura dos quadris. Sem flash. Isso pode gerar registros tremidos (mas não menos interessantes, e que aliás em muito me lembraram as fotos do início do século XX vistas na Casa de Fotografia em Marrakesh). Mas / E geram também esta beleza que é o menino contando seus caraminguás à luz do lampião.





Também eu usei a técnica do quadril (com trocadilho, please), como nesta aqui em Fez ::


Crônicas Marroquinas VII ::: E acaso existirão os marroquinos?

Fez


Antes da viagem, Dorling Kindersley já me advertira que eu deveria sempre pedir permissão a um marroquino antes de tirar sua foto. Os marroquinos, continuou, têm uma suspeita arraigada de qualquer tipo de imagem. Faz sentido, pensei, se lembrarmos (será possível não fazê-lo?) que o islamismo permeia o seu cotidiano e daí, da suspeita e interdição de representar a imagem de qualquer ser vivo (Deus, humanos, bichos e plantas, elenco em ordem de importância), nasceram a extraordinária caligrafia e o extraordinário zelig.

Dorling sabe que eu gosto de fotografar gente (ainda mais que bichos e plantas e Deus) e, face o meu desânimo, acrescentou que eu não estava proibido de direcionar minhas lentes para um marroquino, mas que convinha antes pedir permissão e, depois, deixar alguns dirhams em troca. Nós tendemos a ver isso como exploração, coisa de mercenário. Lévi-Strauss, quando viveu situação semelhante entre os bororos, viu orgulho, no sentido bonito da palavra.

Em Marrakesh comprovei o quanto Dorling e Lévi-Strauss estavam corretos. Era pegar o câmera ou mesmo o Nokinha para que olhos e mãos se estendessem sobre nós. Haja orgulho. Haja dirhams. Claro que se você compra o produto, que pode ser um par de sapatos ou a música de rua, o pagamento já está ali, mas muitas vezes rola incompatibilidade entre o que se dá e o que se esperava receber, o que pode gerar estresse. 

Gostei de tirar fotos assim, como as da incontornável Praça Jemaa el-Fnaa, mas mil vezes as que não se encaixam nesse ajuste de compra e venda.Tudo fica mais fácil quando o sujeito está de costas, ou trata-se de um grupo. Às vezes é preciso malícia e fingir que o registro é da companheira. E com crianças nem é preciso treta. Aliás, fora de Marrakesh tudo foi mais fácil.

(PS: Um amigo enfrentou a situação assim)

A praça



Exemplo de compra, que aqui nem foi concretizada





Em movimento


Treta


Treta

Mais 'compras'


Movimento
Mais fácil. E doce



Minhas diletas