Sunday, December 31, 2017

Vai uma lagosta com pimenta indígena?



Graças ao ISA - Instituto Socioambiental (filie-se!), trouxemos para casa precioso vidrinho de pimenta baniwa, uma pimenta tipo jiquitaia cultivada organicamente pelas mulheres baniwa nas roças e quintais das comunidades do Rio Içana e afluentes, no Amazonas.

Jiquitaia é nome de pequena formiga, cuja picada (dizem) arde horrores. Apropriado, pois. O vidrinho adverte: ALTA PICÂNCIA, de modo que houvemos por bem não pesar a mão ao temperar nossa lagosta-sapateira (cavaquinha), porque vai que depois dá formigamento (com trocadilho), sei lá.

Camila tem mãos e asas de anjo. Manuseou a cavaquinha como se tivesse manuseado cavaquinhas a vida inteira (mas quem a abriu foi o papai aqui), de modo que ela assada ficou simplesmente divina. Evoé, Tupã.

A propósito, a pimenta baniwa e todo o sistema agrícola tradicional do Rio Negro são patrimônio imaterial reconhecidos desde 2010 pelo IPHAN.






InstaGrajaú 8 :: A Feira



Poxa, um ano e meio já que não atualizava esta série. Para os que chegam: fotos do Graja filtradas pelo Instagram. Outras séries aqui, aqui e aqui.

Aqui concentrei-me na feira. Fotos de três anos pra cá.













Friday, December 29, 2017

Feliz Natal



Jorge Amado dizia baboseiras essas histórias de manter-se criança na idade adulta, o mito do forever young, tudo bobagem, só se é criança mesmo na infância e ponto final.

Lembro um pouco disso ao dizer que Natal, Natal de verdade para mim foram aqueles de eu menino e pré-adolescente, em que nos reuníamos na casa da minha avó na Rua Uruguai, ganhávamos presentes, alguns surpresa outros nem tanto e, o clímax ansiado o ano inteiro: a visita dos primos no dia seguinte, o 25 propriamente dito.

Nada, absolutamente nada em minha vida podia ser comparado à chegada dos primos: Alex, Sérgio Ricardo, Ana Beatriz. Foi numa véspera de Natal também, a de 1977, que ganhei o Álbum Branco. Eu na idade já de pedir os presentes, a mãe querendo manter algum espírito de surpresa e Papai Noel, de modo que, dias antes, quando lhe perguntei se a capa era mesmo toda branca, ela respondeu que não. Era meio rosada.

O que veio depois, o que tenho hoje, pode ser muito bom. Boas comidas, estar junto a pessoas queridas. Mas são coisas que, malgrado rabanadas, posso ter em qualquer outro dia do ano.

É o Dante, claro, que torna a fazer a diferença. 

Talvez para ele seja um dia como qualquer outro também, ele querendo rua, balanço, pracinha, piscina, não me iludo. Mas quando lhe dou de presente uma lanterna, ele abre a boca, pois se lembra das consultas médicas. E é ele quem está na bola da árvore de Natal com a Lara. E é ele quem veste o gorrinho para desajeitado selfie. Com a Pampi.

Então Natal como que volta a ganhar sentido



Desamor



Loveless (Нелюбовь) é a história -- terrível -- de uma pequena família russa de um casal e um filho onde reina o desamor. Digo pequena porque me refiro ao pequeno núcleo que vive sob o mesmo teto, mas se expandirmos um pouco, para a casa da avó materna, encontra-se o mesmo desamor. Por desamor aqui não se entenda 'apenas' indiferença. Trata-se de um desamor ativo, isto é, ódio. Ódio entre o casal, ódio e indiferença dos pais para com o filho.

Talvez um lar assombrado por doença, miséria ou drogas se salve pelo amor. Talvez. O que salvará um lar assombrado pela absoluta falta de amor?

Naturalmente que este filme não é o primeiro a fazer isso, mas sempre bom encontrar obras que derribam um conceito terrivelmente ingênuo de maternidade / paternidade. Andrew Solomon: "como se o fato de ter filhos pudesse oferecer um estojo de primeiros socorros para egos feridos e para o desespero incomensurável".

A cena em que o pequeno Alexey chora desesperado e silencioso atrás da porta enquanto seus pais discutem seu confinamento em um orfanato não é para iniciantes. Os gritos "Aaalyooshaaaa" ecoando pela fria floresta, tampouco.

Do mesmo Andrey Zvyagintsev (aqui).

Thursday, December 28, 2017

Poetry, de Marianne Moore



Houve troca de presentes em nossa bodas de madeira e eu ganhei a coletânea da Marianne Moore traduzida por José Antonio Arantes. Presente especialmente significativo, posto que este ano mergulhei fundo em Elizabeth Bishop (aqui, aqui, aqui), que escreveu páginas antológicas e divertidíssimas sobre sua amiga Marianne.

Eu já dialogara com esta difícil poeta norte-americana no poema "Sapos" (aqui).

O que fiz agora foi propor que fizéssemos, de um jato, no melhor estilo first thought best thought, uma tradução para "Poetry".

Aliás, este poema é tão Marianne: começou grande, com quatro estrofes, e ela foi revisando, desbastando até chegar a isto:

POETRY

I, too, dislike it.
    Reading it, however, with a perfect contempt for it, one discovers in
    it, after all, a place for the genuine.

POESIA
Também não gosto. 
    Lendo-a, no entanto, com total desprezo, a gente acaba descobrindo
    nela, afinal de contas, um lugar para o genuíno.

(Trad. de José Antonio Arantes)


POESIA

Eu, também, desgosto;
Lendo, contudo, com pleno desdém, se descobre, afinal, um lugar de verdade.

(Trad. de Camila Veilchen)


POESIA

Também eu desgosto
    Mas se lemos com um solene desprezo, encontramos
    nela, enfim, espaço para o autêntico.

(minha trad.)

Os painéis de Jorge Colaço no Liceu Literário



No ponto de ônibus em Mafra pedi informações a uma jovem mãe que amamentava que, acreditem, jamais visitara o convento, razão pela qual eu estava ali. Acontece. É provável que ela tenha ido antes a Paris do que posto os pés naquele colosso que inspirou Saramago a escrever Memorial do Convento.

Aqui no blog já falei de azulejos de Marrocos e de Valparaíso, mas postagem sobre os maravilhosos painéis de Jorge Colaço (aqui) no corredor de entrada do Liceu Literário Português sai apenas agora. Bem.

Datados de 1937, os grandes painéis de 324 peças no indefectível azul-cobalto retratam o Infante D. Henrique e D. Afonso Henriques. O tratamento dado ao tema recai na exaltação do heroísmo, por supuesto, nada de novo sob o sol, ainda que Estado Novo lá (Salazar) e Estado Novo cá (Vargas). São bonitos, mas gosto ainda mais dos painéis verticais que os ladeiam, não apenas por serem policromados, mas porque neles figuras de mouros são retratadas com a mesma dignidade conferida aos purtugueses.

Não é pouco.















Wednesday, December 27, 2017

Um Novo Olhar :: Fotos


Eu e Camila, bem mais ela que eu, fizemos umas fotos aqui sob a ideia de 'um novo olhar'. Um novo olhar para o autismo, a Síndrome de Down, a diferença e também um novo olhar para a semelhança.

As da Lelê fizemos na cozinha, ela doida para tomar a sopa, espera Lelê, só mais um segundinho, as do Dante foram feitas na pracinha. 

Não é que ambos curtiram imenso? 

Por coisas assim

ps: como não amar imenso esses três?








De covers e originais : Father of Day, Father of Night




Dos casos em que o cover supera em muito a versão 'original' (não acredito em versão original), creio ser emblemático "Me and Bob McGee", escrita por Kris Kristofferson e imortalizada pela Janis, que a cantou poucos dias antes de morrer, a voz maravilhosa como nunca.

(Também não precisavam ter vaiado o Kris no Festival da Ilha de Wight, que dó assistir àquilo)

Outro caso: a faixa que abre o excelente Solar Fire (1973) da Manfred Mann's Earth Band, "Father of Day, Father of Night" é um cover de uma canção de Bob Dylan de 1970. A música do Nobel de Literatura é uma canção folk na voz dele. Fine. A versão do Manfred Mann -- um épico progressivo com todos os ingredientes que o mágico ano do nosso senhor jesus cristo de 1973 permitia, incluindo, por óbvio, um mellotron acachapante -- faz a ""versão original"" parecer uma paródia de uns colegiais bêbados num porão de Oklahoma.




Tuesday, December 26, 2017

Crônicas Sul-Africanas XV :: Fairview para o Natal



Trouxemos da África do Sul garrafa de um Fair View Petite Sirah. A intenção era guardá-la para o Natal ou Ano Bom. Conseguimos.

E foi especialmente auspicioso porque conseguimos atar as duas pontas do ano: a ótima visita à Fair View com este vinho excepcional, de rara varietal.

Dante já dormia, depois de ganhar lanterna e bermuda. Já comêramos os bolinhos de bacalhau e os grãozinhos de bico. Estava tudo quieto. Abrimos a garrafa ( o vizinho do 1503 - Bloco F veio perguntar depois que cheiro era aquele que o deixou desperto a noite toda ) e só a terminamos depois do foguetório do Morro do Andaraí.

PS: A visita à vinícola foi memorável. Incomodou-me, porém, um afresco logo à entrada que retrata apenas brancos felizes bebendo vinhos felizes. O afresco é de 1974, estamos em 2017, quase 2018, vamos mudar um pouco isso? Afinal, is it a fair view or what?

Chamei a atenção do nosso guia, negro, para este aspecto, e ele, que decerto já conduziu tantos grupos até lá, retornou verdadeiramente assombrado: "You are a smart man". E nem acho que eu seja, a coisa é que é óbvia demais.