Monday, December 31, 2018

As Sibilas de Diamantina

Délfica e Líbica


Se é para virar o ano, falemos de sibilas, das sibilas de Diamantina, a única representação de que se tem notícia em toda a América dessas profetisas de Apolo, aqui pintadas no forro da capela-mor da Igreja do Bonfim, talvez por José Soares de Araújo, o grande pintor da região dos diamantes nos setecentos.

Curioso que nos livros antigos elas são quase ignoradas: nenhuma menção no grande Guia dos Bens Tombados - Minas Gerais, nada em Arraial do Tijuco, de Aires da Mata Machado Filho, neca de pitiriba no Bazin. Na monografia Nova Contribuição ao Estudo da Pintura Mineira (Norte de Minas), livro que amo pelas descrições precisas, lê-se:

"Nos panos de muro entre as cariátides, há painéis ovais irregulares, emoldurados por enrolamentos e concheados gríseos escuros, onde representou ingênua e toscamente os temas das "Sibylla Delphica, Sibylla Libyca, Sibylla Phrygia e Sybylla Tiburtina, com alusões às revelações".

Uma descrição fria como a corrubiana que desce sobre a cidade no inverno.

Hoje as quatro mocinhas ganharam justo reconhecimento, com sua presença já anunciada na plaquinha do lado de fora do templo. Muito justo.

Quem quer ver Frígia, Tiburtina, Délfica e Líbica, vá para a Capela Sistina. Ou vá a Diamantina. Se depois comer o Bambá do Garimpo, do chef Vandeca, vai perceber que ficou foi no lucro.

Perdoem o ufanismo, mas se este ano promete baixezas e retrocessos, a gente se agarra às sibilas, à arte, à história e às lindezas do mundo para resistir.

Feliz 2019.

Frígia e Tiburtina

Frígia

Tiburtina

Délfica

Líbica


sibila


Sunday, December 30, 2018

Miguilim não tinha vontade de crescer

Milho Verde (e próximas)

"Miguilim não tinha vontade de crescer, de ser pessoa grande, a conversa das pessoas grandes era sempre as mesmas coisas secas, com aquela necessidade de ser brutas, coisas assustadas."

"Quando a gente voltou, se tomou café, nem ninguém não precisou de fazer café forte demais e amargoso, só o Pai e Vovó Izidra é que bebiam daquele café desgostável."









São Gonçalo do Rio das Pedras (e seguinte)


Guinda


Diamantina
Serro
Conselheiro Mata

Biribiri
 
Lobo Leite (e seguintes)



Saturday, December 29, 2018

Os Meninos de Soledade


Ocorre que, semelhantemente ao que acontecera em Biribi (aqui), em Lobo Leite, distrito velho de Congonhas que doravante chamarei pela graça antiga de Soledade, eu também tirara foto de meninos.

Foi no Natal de 1993, sob chuva.

De modo que passados exatos 25 anos volto eu a Soledade, que lá tem uma igrejinha muito velha e eu preciso descobrir o paradeiro deles.

Encontro - ha! - justo a menina por detrás do boné vermelho. A casa é a mesma, a janela já não tem vidraça. Ela se chama Maria do Carmo, cresceu como todos nós, teve filhos. É uma profusão de primo e prima que me perco um pouco mas encontro minha Maitiña, que vem se achegando depois, muito aos pouquinhos.












Thursday, December 27, 2018

Os Meninos de Biribiri



Tirei a foto acima em julho de 1987, em minha primeira visita a Biribiri. 

Voltei sete anos e sete meses depois (o registro, repito, é de 7/87), foto em mãos, em busca dos meninos. Encontrei um deles, que ouvia Raul Seixas e não se reconheceu. Sua mãe, claro, reconheceu o pequeno e chorou água de dois cocos. Deixei-lhe a foto. Dois outros estavam ali perto, garimpando.

Voltei agora, passados 31 anos do registro -- uma, duas vidas. Foto em mãos, à busca dos três meninos e menina. Não há mais ninguém na casa, mas Andréia, que faz um pernil dos deuses no restaurante do Raimundo Sem Braço e que nasceria cinco meses depois da foto,  reconheceu a todos e me forneceu os nomes: Róbson, Edvaldo, Luís Carlos, Irene. Dois deles trabalham no Aeroporto de Confins e pelo menos um volta com frequência a Biribiri.

Será possível ver o punctum da foto nos sorrisos marotos, no Kichute do Robson, na melissinha da Irene (muitos pensam que ela está amarrando o sapato, mas a melissa não tem cadarço, ela levanta a perna é de pura alegria). Para mim está em suas roupas, como se ser criança em 1987 fosse muito diferente de hoje, como se a foto tivesse quase cem anos.



Wednesday, December 26, 2018

Amós




amar Amós amar um cão assim
um vira-lata bonachão tristonho
que sem esforço recupera em sonho
a confusa missão que Deus lhe deu
In vaccas pingues invehor et proceres
escravizar desprezar humilhar
o pobre o indigente o oprimido
são estes os crimes e o que mudou?
os chefes de Israel e as vacas gordas
só mudaram de nomes a opressão
ora, é bem a mesma se não maior
amar Amós é desamar a mó
para amar o que nela se tritura
para amar o grão sob a pedra dura

Jonas


De boca aberta (como a da baleia)
Jonas contempla o vento e as chuvas que
desgastam lentamente os seus lábios
de onde jorram palavras contra Nínive
Três dias e três noites infinitos
no escuro da baleia sobrevive
triste Gepeto no areal cuspido
Deus precisa falar com Jonas mas
ele não quer conversar com Deus: foge.
E hoje -- dezoito de dezembro -- hoje
quando a negra noite baixa em Congonhas
e o céu mineiro é uma tela cheia
de estrelas Jonas se pergunta (em sonho)
se estará ainda dentro da baleia



Monday, December 17, 2018

Naum



a barba de Naum é como um rio
de pedra -- de pedra também o seu
suor sobre a sotaina longa e velha
a barba de Naum é como a barba
de um visionário doido vagabundo
a barba de Naum descobre o mundo
úmido húmus a nutrir o vento
um único refúgio da loucura
nodosa e retorcida como suas
mãos que agouram a queda da Assíria
a barba de Naum transcende a ira
assim presente nos profetas parvos
a barba de Naum é apenas barba
farta cerrada amarga barba. E basta


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a série para os profetas começou aqui

da série explicar estraga: reparar na bissemia de 'basta'

Wednesday, December 12, 2018

O nome deste rio é Maranhão

Jeremias


o nome deste rio é Maranhão
em Minas coração de Minas se
te causa isso estranheza lembra
o nome desta pedra é sabão
e assim as coisas improváveis fazem
ruído como a água preguiçosa
no cascalho e que susto enfim lembrar
que todo esse diálogo de pedra
entre os velhos profetas no sem-tempo
e o sem sentido apelo do não
foi escrito por um certo antônio
que não tinha dedo e não tinha mão
tinha um cinzel e sonhos em Congonhas
à margem deste rio Maranhão


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a foto não é minha, em breve, good god willing, será

começa aqui série para os 12 profetas

há algum drummond acima, devo dizer onde?



Saturday, December 08, 2018

Crônicas Chinesas I :: Azulejos


Não sei por que demorei tanto a fazer crônica chinesa, talvez estivesse esperando que meus dedos enfim se descongelassem daquele inesperado e violento frio de Beijing.

Vale a pena deixar guardado aqui alguns registros (inda que feitos às pressas) de painéis azulejares  em uma estação de metrô, agora já não lembro se Chegongzhuang, Hepingxiqiao ou mesmo 北京大学东门.

Metrô com azulejo bonito assim lembro de ter visto em Nova Déli, em Santiago, em Madri. E, empatados com estes em quantidade, modernidade e beleza, em Istambul.

Eu voltava à China só para registrar tudo com calma.