Sunday, October 28, 2018

Perdi (ganhei) um livro


Às nove da manhã (eran las nueve en punto de la mañana) postamos no face (essas nossas ninhices) foto de livros que poderíamos levar debaixo do braço para votar no Haddad. Eram eles: Sartre, Drummond, Neruda, Moacyr Felix, uma coletânea sobre a Guerra Civil Espanhola, outro sobre resistência indígena, um em xhosa sobre Mandela e um coelho.

Isso foi às 9. Às 9:30 eu não tinha mais meu Neruda, esquecido no banco do 232.

Saí tão atarantado (ainda estou) com esta eleição que, sim, deixei o livro sobre o banco do ônibus quase vazio que peguei para votar. Só percebi na hora mesmo de me dirigir à cabine.

O primeiro sentimento é de perplexidade. Depois, chateação. O livro foi presente de Natal que me dei em 1986, comprado na Feira do Livro do Largo do Machado. Mas logo percebo que não é nenhum desastre, pelo contrário. Era livro que tinha história e perdê-lo assim só o aumenta. Porque imagino, ainda em Vila Isabel, a Maria Vitória abrindo-o e lendo "Não se perdeu a vida, irmãos pastorais" e deixando-o de volta no banco para que, no Maracanã, o Felipe o abra para ler "Na fertilidade crescia o tempo". Foi devolvê-lo ao banco para que o Sérgio, na Praça da Bandeira, lesse "A poderosa morte me convidou muitas vezes / era como o sol invisível nas ondas". Na Presidente Vargas será a surpresa Pietra que o colherá para ler "Hoje à tua boca venho, hoje a teu rosto". 

E antes ainda que o 232 chegue ao ponto final, será a Laura que o abrirá para ler:

"Feliz ano-novo para minha pátria em trevas".

Thursday, October 25, 2018

E a minha vida está completa : Roger Waters e Marielle Franco



Escrevi nesta postagem aqui sobre os shows do Roger Waters a que assisti, recapitulando os anos: 2001, 2007, 2012, 2013. E agora, 2018.

Qual o melhor?, perguntou-me uma aluna querida hoje, que foi ao show também. Bem, nunca mais ouvi ele tocar "Money" (música que até então eu não gostava) como em 2001, nem nunca a cachorrada latiu tanto como em 2007 (em um bis!); o The Wall inteiro será sempre o The Wall inteiro, como em 2013 e uma ópera ópera mesmo só em 2013, com Ça Ira.

Mas foi só ontem que ele falou sobre a Marielle Franco. Que vestiu a camisa, que dividiu palco com a família -- filha, irmã e viúva. Foi o único não apenas dentre os shows que fui, mas dentre as suas milhares de apresentações em seis décadas.

Não é pouco, digamos.





Monday, October 22, 2018

Campeonato Dente de Leite 1978


Encontro minha carteirinha do dente-de-leite de 1978, o primeiro campeonato do garoto que já estava no São José há três anos.

A experiência de defender o Goiás como zagueiro em 1978 foi tão marcante quanto inesquecível. Vinte anos depois, em 1998, quando escrevi capítulo das minhas memórias, obviamente tomado pelo Nava que acabara de descobrir, foi todo esse capítulo dedicado à campanha do Goiás no Campeonato Dente de Leite do Colégio Marista São José, aquela construção colossal na Usina.

O primeiro jogo perdemos de 8 a 0 para o Grêmio. O segundo, 11 a 0 para o Itabuna. O terceiro, 4 a 1 para o Colorado (fizemos um gol). Na segunda fase, perdemos de 6 a 0 para o Palmeiras (eu no gol), apenas 3 a 0 para o Santa Cruz, que seria campeão, e miraculosa e inexplicavelmente vencemos o mesmo Colorado da primeira fase por 4 a 0.

Meu pai era o patrono, nome que davam ao técnico.

Dele herdei assinar o 'm' com um traço.

Sunday, October 21, 2018

#EagoraTSE?



E agora, TSE?
A farsa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
o dia esfriou,
e agora, TSE?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que não faz versos,
que odeia, protesta?
e agora, TSE?


Está sem amor,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
torturar isso pode,
o dia esfriou,
a noite instalou-se,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, TSE?

E agora, TSE?
Sua difícil palavra,
seu instante de febre,
sua gula e prosápia,
sua biblioteca vazia,
sua lavra de ouro,
sua toga de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a bíblia na mão
finge abrir portas,
não existem portas;
quer matar no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Miami,
E o dólar tá caro.
TSE, e agora?

Se você julgasse,
se você pensasse,
se você passasse
a mão na consciência,
se você amasse,
mas a consciência
você comeu com farinha...
 E você não morre,
você é frouxo, TSE!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem constituição,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo branco
que fuja a galope,
você marcha, TSE!
TSE, para onde?

Gozando Junto com as Mulheres Contra B171 ::: Goz Junt XXXVII


Para quem ainda não sabe, Gozando Junto consiste em registros fotográficos de pessoas tirando fotos. Já fiz até exposição e agora virou tag no blog. Nada mais justo, que já são 37 postagens. Em manifestações como a de ontem -- Mulheres contra Bolsonaro -- as oportunidades se oferecem ante os olhos, a todo tempo, por todos os lados.

O Gozando Junto da primeira maior manifestação está aqui.

















Saturday, October 20, 2018

Mulheres Contra Bolsonaro na Cinelândia


O movimento do primeiro turno (aqui), no mesmíssimo local, estava bem mais cheio, é verdade, mas o de hoje não foi menos bonito e emocionante. E divertido, porque a gente se diverte, mesmo com as nuvens pretas no céu da política do país porque não sabemos ser de outro modo e nem queremos, por unha sequer, nos assemelhar aos eleitores do Coprófilo.

Teve gritos de guerra, muita cantoria, teve dança, teve leitura de manifesto e uma pequena apresentação do Teatro do Oprimido. Depois a caminhada para a Lapa.

( Sim, haja vista a cumplicidade podre do STF e do TSE, é possível que a vitória não venha. Mas não vamos entregar sem luta. E a luta não cessará )





















Monday, October 15, 2018

Athos Bulcão : Quantas coisas as pessoas podiam fazer e não fazem


Uma festa para os olhos a exposição do centenário de Athos Bulcão no CCBB de São Paulo. Veio de Brasília, deve chegar ao Rio, então verei novamente, mesmo porque me interessa ver possíveis diferenças entre as montagens.

Estavam lá os azulejos, claro, ou não seria. Mas estavam também muitas pinturas, antigas e recentes, croquis, depoimentos (ótimos; iluminam, acalmam), peças de roupa, uma sala só para as fotomontagens, e aí é impossível não lembrar de Jorge Lima. Estava lá capa de disco para os poemas de Vinícius e Paulo Mendes Campos. Estava lá imenso cubo, todo ele azulejos athos bulcão, em redor do qual meninas brincam e se escondem.

Sabe-se que Athos incentivava os pedreiros / operários a colocar os azulejos como bem quisessem, de modo que uma elipse que começa aqui não termina necessariamente ali, talvez nem termine, talvez seja outra que comece. Há uma parede no Sambódromo assim. Pesadelo para os pacientes de TOC de organização. Paraíso para crianças e andorinhas.

Eu gostei muito de Brasília. Fiquei hipnotizado com aquela falta de paisagem, o céu, esta vastidão. (...) Eu acredito muito em disciplina, no vai lá e faz alguma coisa. Eu fico imaginando quanta coisa as pessoas podiam fazer e não fazem.

Só foi mais complicado acertar como começar. Depis ficou fácil. É só colocar tudo invertido. Espero que fique bom. ( João Alves dos Santos, pedreiro responsável por assentar os azulejos na sede da Fiocruz, em Brasília-DF )