"A história que meu pai não contou", de Victor Giudice, cabe fácil numa seleção dos melhores contos da língua. Dez melhores. Enigmático, cruel, cortarzariano, mas sobretudo na linha de Dino Buzzati (aqui) .
São do Victor os melhores registros de São Cristóvão (aqui), onde morou :: o seu Urucuia, o seu Yoknapatawpha.
Trocando em miúdos: Sara Maria não me dava a mínima atenção ou, para ser mais exato, nem me enxergava. Todas as tardes, quando as aulas terminavam, eu assistia ao seu desaparecimento, engolida pelas alamedas do Campo de São Cristóvão daquela época: um imenso jardim francês, enfeitiçado por infinitos canteiros de dálias brancas e gérberas amarelas, em meio a uma guarnição de arbustos, aparados em forma de gansos, elefantes, cavalos. Um jardim de Montrouge não seria mais satisfatório. Entre os canteiros, os flamboyants completavam o cenário, as alamedas onde Sara representava sua indiferença. Estoicamente, na ingenuidade dos onze anos, eu me escondia entre as colunas em frente ao Cinema Fluminense, para deixar o coração esfacelar-se a cada passo da minha ideia fixa. As meias brancas, sublinhadas pelos sapatos de verniz, eram os últimos pontos a se perderem, quando a saia verde já se confundia com a vegetação, e os cabelos louros com o sol poente. A paixão solitária foi o motivo, mais solitário ainda, da minha hospedagem no Hotel da Morte.