Friday, September 09, 2011

Em Santa Rosa, como em Roma

Quando se entra na Santa Maria Maggiore, em Roma, percebe-se imediatamente o monte de gente andando pra lá e pra cá de olhos cravados no chão. A igreja é linda e pode-se olhar para cima, para frente, em qualquer grau ou posição, com a certeza de conceder à vista um deleite. Mas parece que o ponto alto, com o perdão do paradoxo, está naqueles mosaicos do piso. Como em San Marco, em Veneza, pois, o segredo da visita à Santa Maria Maggiore consiste em andar de pescoço reclinado em 90 graus, com a atenção de quem procura lentes de contato numa plantação de couve.


Comigo e com Ana não foi diferente. Em Roma com os romanos ou, aqui, como os turistas de Roma. Deambulávamos pela nave quando, súbito, uma desconhecida toca Ana no braço e pergunta-lhe: Dove hai comprato questa scarpa? Era uma mulher inteiramente desconhecida que, sem sequer um Buon giorno, quer saber onde minha mulher tinha comprado os sapatos que calçava! Os sapatos mais interessantes que os mosaicos! Não, perdoem-me o sexismo, mas a mulher não poderia ter sido mais mulher. Ana e a desconhecida, de quem jamais saberemos nome, nacionalidade, estado civil, posição sexual favorita ou, ao menos, o número do sapato, são como que dois planetas vagando no espaço. Quando, por uma espantosa conjunção astrológica, se tocam, tudo que a mulher quer saber é... onde minha mulher tinha comprado seus sapatos. Mulheres e sapatos. Toda mulher uma Imelda Marcos, assumida ou enrustida.


Voltando à história, Bia, profundissimamente estupefata, gagueja, menos por seu italiano incipiente, um A Brasile, ao que nossa distinta faz um gesto com a cabeça e, pronto, os dois planetas tornam-se a separar, desta vez para sempre.


O episódio, claro, virou piada interna, item de léxico familiar. Por anos, a leve menção à sapato traz para nós aquela tépida manhã em Roma. Como em:


- Já tá pronta? Vem logo!

- Calma, tô calçando o sapato.

- Dove hai comprato questa scarpa?




Isso tudo me veio à mente ontem na Basílica de Santa Rosa. Quando trago Dante à fisioterapia, por vezes frequento a sessão, por outras, fico de fora lendo ou saio para passear. Até bem recente todas minhas andadas tinham sido para os lados de Icaraí (onde a clínica se situa), mas recentemente descobri qão perto estava de Santa Rosa. E Santa Rosa tem a Basílica de Nossa Senhora Auxiliadora. Claro que eu já estive aqui, mesmo para assistir a um concerto neste órgão monumental, mas só ontem (a história da mão que nunca se molha no mesmo rio duas vezes) atentei para a beleza dos azulejos hidráulicos do piso. Mal eu transpusera a fachada, bem antes do transepto (fiz questão de não avançar muito), contabilizei essas quantas variedades...














E a igreja vazia, sem alma que perguntasse a origem de minhas sandálias...

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