Enfim li O Filho Eterno, do Cristovão Tezza. Lembro-me de que quando comentei com uma amiga acerca da condição do Dante (recém-descoberta), ela pronto perguntou: "Você já leu O Filho Eterno?" Não tinha, e relutei. Enfim.
Chega a ser pueril que eu selecione, de um romance extraordinário, duro e corajoso, um trecho lá do final sobre... futebol. Mas esta coisa nenhuma que, como se lerá, ajudou na inserção do Felipe (é ele o filho eterno) no mundo, também aproximou-me deste mesmo Felipe, personagem, ser de papel, mas também ser de carne e osso, torcedor apaixonado do Atlético Paranaense e colecionador de camisas de futebol. Falarei disso depois.
Bem, o trecho foi também selecionado porque poucas vezes (if ever) vi o ludopédio assim tão bem descrito...
"O futebol, esse nada que preenche o mundo, o pai imagina, logo o futebol, uma instituição de importância quase superior à da ONU e que ao mesmo tempo congrega em sua cartolagem universal algumas das figuras mais corruptas e vorazes do mundo inteiro, um esporte que onde quer que se estabeleça é sinônimo de falcatrua, transformado num negócio gigantesco e tentacular, criador de mitos de areia, a mais poderoasa máquina de rodar dinheiro e ocupar o tempo jamais inventada, a derrota final das inquietações do dasein de Heidegger, o triunfo definitivo das massas, o maior circo de todos os tempos, vastas emoções sobre coisa alguma -- o pai vai se irritando sempre que pensa, escravizado também ele àquela dança defeituosa que jamais completa mais de cinco lances seguidos sem um erro, um esporte que sequer tem arbitragem minimamente honesta até mesmo por impossibilidade do olhar dos juízes de dar conta do que acontece (em todos os jogos do mundo acontecem falhas grotescas), e no entanto urramos em torno dele, a alma virada do avesso -- pois o futebol, essa irresistível coisa nenhuma, passou lentamente a ser para o Felipe uma referência de sua maturidade possível" (pp. 218-219)
(Meu filho eterno, já quase preso a essa coisa nenhuma...)