Mas engana-se quem pensa que comi satisfeito o frio prato da vingança com o destino da Modern Sound. Acho o seu fechamento lamentável. Uma boa loja de CDs, assim como uma boa livraria, é um dos poucos refúgios de civilização em um mundo inóspito, ainda que o atendimento, como frisei no post anterior, deixe às vezes a desejar. Mas esta é uma das escolhas do mundo contemporâneo, não apenas dos cariocas ou brasileiros. Escolheram baixar, baixar tudo em vez de comprarem CDs. Há os que baixam para conhecer e depois compram. A maioria apenas baixa, julga-se mesmo no direito de fazer downloads ilegais. Lembro-me de quando começou essa história, conversei a respeito com o dono da Penny Lane, loja de CDs especializada em rock progressivo situada no Flamengo. Que, claro, já fechou. Um colega tinha gostado do CD da trilha de As Horas (comprado da Modern Sound) que eu lhe mostrara e o tinha baixado em casa. O dono da finada Penny Lane disse simplesmente: “É um CD a menos que vou vender...”. E assim, de CD a menos a CD a menos, fecham-se lojas. Em breve, post sobre o assunto.
Tenho muitas lembranças boas da Modern Sound. Lá comprei dois Nymans difíceis: o The Kiss e o já mencionado O Marido da Cabeleireira. Lá, por volta de 2000, adquiri o célebre livro do Paolo Barotto, The Return of the Italian Pop, então única referência sobre a cena progressiva italiana e que me serviu de bíblia por anos. Aliás, a MS tinha uma vasta seção de rock progressivo, algo inédito nesta cidade, excetuando-se, claro, as lojas especializadas como a Halley. Lá, em quente janeiro de 1997, comprei a integral das sinfonias do Prokofiev, regência de Seiji Osawa, bem como o Alexander Nevski. Lá comprei (2001?, 2002?), o Sandinista, do The Clash, e, de rock progressivo italiano, o Frontiera, do Procession, o Duello Madre, e alguns itens raros como o Laser, o Franco Maria Giannini e o fabuloso Enzo Capuano, dentre outras coisas. Lá comprei também o vídeo (VHS!) do Unplugged, show memorável do 10,000 Maniacs. E foi na MS também que redescobri (e comprei) um dos melhores discos infantis brasileiros, o Brincando de Roda, da Solange Maria, que só conhecia em fita cassete. Tudo, claro, a peso de ouro, que para a loja o dólar estava sempre altíssimo e ele não eram de dar descontos (a não ser, claro, fosse você um Chico, um Ed, uma Rita).
Bem antes disso, foi lá, em 1982, que fiz minhas primeiras compras de disco importado. Depois de meses economizando o dinheiro da merenda, meu irmão e eu vamos lá com a grana suficiente para dois discos. Compro o Live I, do Cream; ele, o primeiro do Iron Maiden, totalmente no escuro, atraído unicamente pela capa. O Iron aportava assim na cidade, nas caixas que ficavam logo à entrada, antes de serem catalogadas nas respectivas seções. Poucos meses depois, no meu aniversário, o pai generoso concede-me três (!) discos importados. Nessas célebres caixas, que ficavam no chão, descubro os dois primeiros do Ozzy e o ao vivo do Judas Priest, o Unleashed in the East que tornar-se-ia um de meus discos de cabeceira pelos próximos anos, fazendo mesmo com que eu passasse a assinar Evandro Luis Halford.
Tudo isso na Modern Sound, que ora fecha as portas para sempre.
2 comments:
Lindo e nostálgico texto ! E assim conhecemos sua história, através dos livros e discos...Que o fim da MS não apague a memória do Mr. Halford...
O fim das lojas de discos, que é resultante da crise fonográfica me entristece pelos maravavilhosos discos que não serão gravados, não serão lançados e não serão vendidos. Eles não mais existirão! Pois sem dinheiro rodando na área fonográfica, não se paga bons arranjadores, bons produtores, bons engenheiros de som e bons músicos. Discos antológicos não serão mais gravados e assim, a arte, a música, a História e todos nós é que perdemos.
Post a Comment