Sunday, March 31, 2019

Lula Livre pelas Ruas de Curitiba



Aconteceu em Atenas, janeiro de 2014: saí com a recém-comprada camisa do Olympiakos para logo descobrir-me em área totalmente dominada pelos torcedores rivais do Panathinaikos. O registro da aventura está aqui.

Agora foi andar com camisa do Lula, Lula Livre (e no verso 'Eu avisei') pelas ruas de Curitiba. Nem foi planejado. Fomos à Vigília e, de lá, ao centro e ao Museu Oscar Niemeyer. A ideia era trocar a camisa, mas resolvi mantê-la, não sem cautela. Ao meu lado Pampi ia de "Ninguém solta a mãe de ninguém".

No Sebo Ideal funcionária se dirige a mim: 'Gostei da camisa' e me sinto subitamente fortalecido. Ao procurar um painel azulejar em área de imigrantes ucranianos, percebo moças, no banco traseiro de um carro, acenando felizes para mim e garanto que não era flerte, que eu estava (muito) bem acompanhado. Ou era flerte sim, mas com aquele outro barbudo estampado na camisa.

Na fila do Oscar Niemeyer as reações são mais efusivas: uma senhora se anima e começa conversa e em seguida um grupo pede para tirar fotos conosco. Sentimo-nos de volta à Índia.

Em seguida um restaurante e depois, na calçada do Cine Passeio, dois jovens se dirigiram a nós com os "É isso aí, ninguém solta a mão" e coisas do gênero.

Por óbvio que houve também olhares perplexos, não propriamente coléricos, mas que não se materializaram em palavras. 

Mas o saldo foi muito positivo, mesmo porque há sempre certo efeito de irradiação, de encorajamento.

Saturday, March 23, 2019

Join Together : THE WHO


Lançada como single em 1972 e depois incluída em algumas antologias, "Join Together" é provavelmente a pior música do The Who. Um Slade piorado, com refrão chiclete de resto agravado pela redundância gramatical ("Join together with the band").

Há um vídeo de uma apresentação em playback que nos remete à segunda fase dos programas do Chacrinha na Globo, quando ele conseguiu ser pior do que fora até então.

Salva a música a jew's harp, mas que muitos podem achar tão irritante quanto o kazoo de "Corporal Clegg" do Pink Floyd (a respeito do qual escrevi aqui).

Foi com esta música tola e detestável que Alan Veste encerrou a apresentação de Tommy ontem no Rio. Explico: depois do Tommy completo (versão filme do Ken Russel e não a do disco original de 69), a banda toca "Won't Get Fooled Again", "Baba O'Riley" "Behind Blues Eyes", "Who are You" e, cereja do bolo, "Join Together" (sem jew's harp).

Cantei a plenos pulmões. Depois de Tommy e dos clássicos, caiu bem demais.

Ontem gravei um trecho, que hoje pela manhã mostrei à Camila. Ela disse: "Ficou bom, mas tem um pessoal aí que desafina, hein?". "Sou eu", respondi e rimos a bandeiras despregadas, como então se dizia.

Nunca amei tanto "Join Together".





Friday, March 22, 2019

Amazônia em PB


Um pouco da Amazônia em pb,

homenagem talvez ao profundo rio negro, de águas mornas e escuras (e com menos mosquitos)











Monday, March 18, 2019

Crônicas Amazônicas IV : Que livro levar


Que livro levar para Manaus e para a selva, para o tempo que sobra entre um tambaqui e outro, entre um lago e um igapó, entre pesca de piranha e sesta na rede, entre a rede e o tambaqui, igapó e sinuca, entre Novo Airão e o Tupana?

Pensei em A Mata Submersa, de Peregrino Júnior, mas fiz bem em deixá-lo no Grajaú: textos que pesam a mão no regionalismo e não transcendem o causo. Interessantes, ainda.

Levei foi o Dalcídio Jurandir, que li muito tão logo o descobri, isso no começo dos 90.

Que reencontro.  

"Mas adeus? Adeus nesta perneira rangendo até o pescoço? Adeus? Despedir-me dos fantasmas que me habitam? Ah nem bateu as sete e meia e já neste sol suando feito um recruta no rumo do quartel, ou atrás da oculta e renegada Luciana? Adeus? O raio também vai me abrindo um caminho, não na rua, nuvem ou rio, mas em mim mesmo, neste verdoengo e secreto ser que sou."

"O que restou deles dois boi pisou, cobriu com a sua obra verde, logo dura no sol? Não mais aquela nem a de agora, e esta, aonde? Tornarem-se amigos, como se ensina o modo? Amantes? Amantes de tal pegadio só por força do Guajará, o lago que faz soar coisas no fundo, puxa por baixo o mar de longe, aí sempre os dois amantes, dos dois dobrado o encanto." 

Minha edição de 'Primeira Manhã' tem o autógrafo ao Valdemar Cavalcanti, poucos dias antes de eu nascer

Saturday, March 16, 2019

Rolinhos de Banana com Linguado


Tínhamos apenas dois almoços em Novo Airão e os fizemos, segundo a tradição do velho Hélio Domingues de repetir o que gostou, no Flor do Luar. Pra piorar, pedimos o mesmo prato: tambaqui de banda. Divino, à falta de palavra melhor.

Em Manaus fomos ao Caxiri, aliás da mesma chefe do Flor e eu fui de hambúrguer. De tambaqui. Aí veio a última refeição em Manaus e batemos ponto no... Tambaqui de Banda (quantas vezes a palavra tambaqui em dois pequenos parágrafos?), à sombra do Teatro Amazonas, as mesinhas do lado de fora, o clima delicioso.

Queria pedir coisa diferente (o cardápio é extenso), mas Pampi insistia que não fazia sentido não pedir o carro-chefe, que batiza o restaurante. Anuí. Para não dizer que não pedimos nada de diferente, apostamos numa entrada típica do melhor comida de buteco: um peixe enrolado na banana-da-terra, aqui chamada de pacovã.

A pacovã já aparece num clássico da culinária amazônica: o pirarucu de casaca, que conheci há muitos anos no Francisco em Brasília.

O melhor de pedir essa entrada foi prometer que, once back home, iríamos reproduzir a receita em casa. Reproduzir, imitar, emular, com perdão da feia palavra.

Não passou nem uma semana e olha aí nosso linguado enrolado na banana-da-terra.






Crônicas Amazonenses III :: Uma árvore toda ela Japiim



Quem leu Tristes Trópicos não esquece que, lá pro final, Lévi-Strauss narra experiência que teve entre os tupi-cavaíbas: o chefe Taperahi, deitado na rede, representa uma peça de teatro, "ou, para ser mais exato, uma opereta, com mistura de canto e texto falado".

O enredo desta peça / opereta gira em torno das aventuras do pássaro japiim, japim ou xexeú que, ameaçado por outros bichos, se defende, mistifica-os de diversas maneiras e acaba por vencê-los.

Eu sempre quis saber como era o canto desse pássaro e, para grande alegria, encontrei-o em profusão por aqui: seus ninhos de ponta-cabeça nos margens e igapós do Rio Tupana e numa comunidade ribeirinha, numa árvore de resto habitada por solitária arara azul.

Mas não só. Eles em profusão também em Manaus, em algazarra nas árvores de Ponta Negra, centenas de operetas simultâneas.



Tuesday, March 12, 2019

Crônicas Amazonenses II :: Buritis


São tantos os buritis no caminho entre Careiro da Várzea e o bravo Rio Tupana, tão enfurnado no meio da mata. Não esperava encontrá-los por aqui, e assim em quantidades, e assim robustos. A diferença é que no norte de Minas ao agrupamento de muitos no terreno onde há sempre alguma água dá-se o nome de vereda, enquanto que por aqui chamam de charco

Quando desci o Rio Urucuia em viagem de 1992 (Buritis-Arinos-Urucuia) para chegar ao São Francisco (São Romão- Guararavacã do Guaicuí-Pirapora), esbarrei em muitas veredas, mas hoje, com tanto eucalipto, cana e soja, elas vão rareando, o que é triste demais.

Ao menos no caminho entre Careiro da Várzea e o Rio Tupana os há a mancheias. E, para glória do Senhor, havia ainda dois em meu hotel.

Me deu saudade de algum buritizal, na ida duma vereda em capim. Saudade, dessas que respondem ao vento; saudade dos Gerais.

Diadorim, Diadorim, oh, ah, meus-buritizais levados de verdes... Buriti, do ouro da flor 






Monday, March 11, 2019

A gente nunca podia apreciar as coisas bonitas

Rio Tupana-AM

Verdade consabida, porém não menos extraordinária esta história de que a viagem continua, forte, após o regresso, quando então formamos dela mínimo entendimento. Não sei se sempre ou quase, desnecessário precisar.

Me vem à cabeça um trecho lindo de "Os Cimos", conto que encerra as assombrosas primeiras histórias do Rosa:

"Que a gente nunca podia apreciar, direito, mesmo, as coisas bonitas ou boas, que aconteciam. Às vezes, porque sobrevinham depressa e inesperadamente, a gente nem estando arrumado. Ou esperadas, e então não tinham gosto de tão boas, eram só um arremedado grosseiro. Ou porque as outras coisas, as ruins, prosseguiam também, de lado e do outro, não deixando limpo lugar. Ou porque faltavam ainda outras coisas, acontecidas em diferentes ocasiões, mas que careciam de formar junto com aquelas, para o completo. Ou porque, mesmo enquanto estavam acontecendo, a gente sabia que elas já estavam caminhando, para se acabar, roídas pelas horas, desmanchadas..."



(E a legenda para a foto retiro-a de um soneto do Afonso Félix  de Sousa:
"Ela ia macambúzia e lenta como um cágado.
A cada flor ou lua ela se dava inteira.")

Vinícius de Manaus :: Crônicas Amazonenses I



Há 45 anos, numa sexta-feira 13 de setembro, Vinícius de Moraes esteve em Manaus acompanhado do Toquinho e do Quarteto em Cy para duas apresentações musicais. A do primeiro dia começava à meia-noite, o que deixava ao poeta tarde imensa com varanda se espraiando para o começo da noite. Vinícius aproveitou-a no Bar Caldeira, no coração da cidade, bem atrás do Teatro Amazonas, em companhia dos boêmios da capital.

O bar continua lá, com poucas modificações. Não por acaso, tornou-se em 2015 patrimônio imaterial, junto com o Jangadeiro e Bar do Armando, outros dois redutos dos pinguços manauaras.

Nas paredes, a reprodução de um bilhete do Vinícius e a foto extraordinária.

Encontramos com o homem de paletó escuro que sorri ao lado de Vinícius. Parece que de 1974 até hoje ele saiu do bar apenas duas ou três vezes.

O que já justificaria também o seu tombamento.