Friday, August 31, 2018

Acho que meu filho tem alguma coisa na cabeça


Acho que meu filho tem alguma coisa na cabeça. Sério, essa história desses acalorados carinhos, essas birras cósmicas, essa boquinha desenhada por Parrásio, essa gargalhada que ninguém tem, o castanho infinito dessas íris, essa maneira de me agarrar pelo colar, de bater no sofá a pedir / ordenar que eu me sente ao lado.

Acho tem alguma coisa na cabeça. Imperioso anuir, aceder, ceder. Estou como Maiakóvski, 'Socorro, mãe, chame os bombeiros'.

Ah, um texto bobo só pra acompanhar coisas que ele já botou na cabeça este ano. 









Trilha, again:

'I never felt magic crazy as this
I never saw moons knew the meaning of the sea'



Q'aphchik'ijllu


Há algum tempo, que não sei precisar quanto, Cusco, tomada por nova onda de orgulho indígena (nenhuma ironia aqui, pelo contrário), trocou diversos nomes de ruas do centro histórico. Sai o castelhano, entra o quéchua. 

Verdade que muitas dessas ruas são ainda conhecidas pelos nomes antigos, mas isso é assim mesmo. Mera questão de tempo para que se refiram à Calle Triunfo pelo tão mais bonito novo nome Sunturwasi (pelo que me lembro das aulas de quéchua do 2o grau: wasi = casa; suntur = encontro).

Aproveitando o ensejo: descobrimos que a Praça Malvino Reis, no Grajaú, que de praça pouco tem, homenageia militar torturador, tão a gosto do bairro. Eu trocava mole seu nome para Q'aphchik'ijllu.







Thursday, August 30, 2018

As Renovadoras de Cuzco ::: Crónicas Peruanas XII


Tive um professor de História gordo e barbudo (epa!) de nome Mercadante. Um colega seu, o Cauby, de Português, chamava-o de Merdandante, trocadilho ótimo e de fato Mercadante era bem mal-humorado e sabia ser bem grosso. Defesa, talvez, contra aquelas turmas enormes (45, 47 alunos) da fina-flor da burguesia tijucana que podiam engolir vivo qualquer professor.

Lembro de vê-lo rir uma única vez, assim como lembro dele falando de mais-valia e exploração do sistema capitalista. Falou nos sapateiros e suas portinhas sujas e entulhadas para as quais ninguém presta atenção, certamente ninguém daquelas turmas enormes do Marista São José.

No entorno do Mercado San Pedro em Cuzco (aqui), há várias dessas portinhas (a quem chamam de renovadoras!), uma das quais, a Elmer, chamou-nos a atenção em especial, pois prometia ser o local de encontro dos meus grandes amigos. Quem são meus grandes amigos, Elmer? Meus sapatos? Meus amigos mesmo? 

Ah, já não era só uma portinha 




Crônicas Peruanas XI :: Arequipa



Ver Arequipa como a "segunda maior cidade do Peru" pode ser enganoso, de vez que ela é quase dez vezes menor que Lima. Ou seja, definitivamente não se trata de cidade grande, ninguém ainda a tornou "bonita" naqueles termos do Manuel Bandeira, com avenidas e arranha-céus. Graças a Inti e que Supay leve quem tente fazê-lo.

Arequipa segue sendo, pois, cidade do Misti, da Juanita, da Santa Catalina, das picanterías (aqui), de Teodoro Núñez Ureta, do Llosa, que lá nasceu mas não viveu. A Cidade Branca, a República Independente da Virgem do Sombrero. Os sombreros. Um barroco insano e paradisíaco. E sempre algo mais, que escapa aos guias, como a Chelawasi e o portão aquele mesmo portão da casa da minha avó na Rua Uruguai, 56, quase esquina com a Maxwell.