Thursday, June 21, 2012

Os Clochards de Icaraí



OS CLOCHARDS DE ICARAÍ
Pro Felipe Barroso

O primeiro, a bem dizer, sumiu de Icaraí, última vez que o vi ocupava todo um abrigo de ônibus perto do Terminal. Velho bardo barbudo, tem seu carrinho de supermercado e três cachorros, igualmente clochards. É manso extático, San Juan de la Cruz, mas tem rompantes agressivos se mexem em suas coisas. Há sempre mosquinhas luas ao redor de seus olhos planetas distantes e enevoados.

A segunda é imensa de gorda, tem os dreads que rastafári de colégio nenhum jamais ousara. Aqui a verdadeira filha de Jah. Veste-se de andrajos, trapos quase da sua cor. Caçadora-coletora, vive à cata de guimbas, mas certa vez encontrei-na na fila do Mega Matte, logo atrás de mim. Senta-se defronte à igreja e arregaça as pernas, a  buceta peluda à mostra. Se a nudez desestabliza o mundo (vide Courbert), imaginem a de uma mendiga.

O terceiro vive na praia. Embora caminhe, tem preferência manifesta pelos bancos em frente à Presidente Backer. Meneia o dorso vigorosamente e às vezes tem um tubo de soro (vazio) atado ao braço. Sente-se seu cheiro de longe. Certa vez marquei com uma paquera: olha, duas ruas depois do mendigo, você vai sentir pelo cheiro. Acho que ela não gostou e não foi. Um dia, quase nu, vestido de nariz de palhaço, assobiava vigorosamente com dois dedos na boca, em La Maior. As pessoas passavam pra lá e pra cá, como é dever das pessoas. Quando parei para ouvir, vi que ele assobiava o Hino Nacional. Genial. Fosse em Kassel, seria uma performance.

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