Tuesday, February 28, 2017

Carmelita tem seu dia de Barba



Digo, Carmelitas tem seu dia de Barbas, o bloco famoso pelo carro-pipa. Bem, se não chegou a ser carro-pipa, pelo menos teve mais de um e sem risco de perda total do celular.

Aliás, decidimos: em 2018 seremos nós de mangueira na mão. Falta agora comprar o palacete na Santa Teresa.











Sunday, February 26, 2017

Eli Levin, Pintor de Bares



Nascido em 1938 em Nova York e estabelecido em Santa Fé há mais de cinquenta anos, o pintor Eli Levin tem, coloquemos com alguma modéstia de expressão, leve inclinação para retratar bares.

Seria ingênuo considerá-lo realista. Vejo nele um tanto do expressionismo alemão, um Otto Dix (sem tanta crueza). E também, claro, James Ensor (idem).

Acho que todas as obras postadas aqui são óleo sobre tela, mas haverá alguma aquarela.

As brigas são particularmente perturbadoras. Mas as demais também.














Saturday, February 25, 2017

Magical Mystery Cachambi



É preciso ser fã muito empedernido dos Beatles (opa) para gostar do filme Magical Mystery Tour, definição visual perfeita do que significa autocondescendência ou, em linguagem mais simples, falta de autocrítica. Embora possa se ver aqui (e já viram) um percursor de certo humor nonsense britânico, coisa cara ao Monty Python. E embora, claro, haja pelo menos duas canções geniais: "Hello goodbye" e "Your mother should know".

Do filme em si a cena quiçá mais memorável, pelo que há de bom (o tal do nonsense) e de ruim (a autocondescendência)  é aquela em que o John, como garçom, serve espaguete a uma cliente gorda em um restaurante. Serve sem parar.

Só pra dizer que isso tudo me veio à mente no almoço de hoje no impagável Cachambeer. Camila nada tem de cliente gorda, ainda mais agora com a sua low-carb, mas o garçom servindo-lhe o risoto de costela, leia-se uma montanha, o que foi aquilo, ela com a mãozinha em riste pedindo que parasse. O bar / restaurante, famoso pelo nome irreverente dos pratos, como "infarto completo" e "porquinho embriagado", para este risoto inventou slogan perfeito: 'Difícil é achar o arroz'.

Perfeito. E delicioso.


Crônica Única para Angola



Estivemos em Angola? Não, não estivemos. Aeroporto é aquela impessoalidade, lugar de espera, de passagem, de tédio, de esmolar por um sinal de wi-fi, lugar sem alma, na verdade um não-lugar, tão ao gosto de Win Wenders. Em Luanda, então, porventura a capital mais cara do mundo, uma camisa de futebol de terceira categoria no acanhado aeroporto custa o olho esquerdo, o caderno em quimbundo, o direito, e já não haverá com que pagar o outfit estampado de bode, tão black metal, que encanta Camila.

Mas não é que entre uma Cuca e outra (ah, houvera um copo para a coleção a vida subitamente faria sentido), entre um fino e um prego no pão, entre uma palavra e outra trocada em português com os funcionários, alguma coisa se descobre?












Friday, February 24, 2017

Rua Major Ávila : Dentro da Noite Azul



Acredito que a Rua Major Ávila tenha a sua importância na Tijuca, mas hoje é, como tantas outras, um tanto quanto anódina. Uma pena. RUA MAJOR ÁVILA é o nome do segundo capítulo do Chão de Ferro, do Pedro Nava, e só isso (eu e meus exageros) já basta para colocá-la no rol dos logradouros mais importantes desta urbe.

Foi nesta rua em que Nava morou em 1918 com seus tios Ennes de Souza. Deixo-o falar:

Desde que chegara ao Rio tinha frequentado semanalmente sua residência acolhedora e hospitaleira. (...) Mas isso era visitar. Agora ia conviver, morar com essa gente fabulosa e só por essa razão e nesse 1918 começo a tratar de fatos a que assisti e de que participei, desde que chegar ao Rio. Os Ennes moravam à Rua Major Ávila, 16, em frente à Igreja de Santo Afonso. Em pleno coração do Engenho Velho. Dum lado dava-se na Praça Saens Peña e do outro na Rua Barão de Mesquita que mergulhava nas imensidades cariocas de São Francisco Xavier a Uruguai, até além, no nascente Grajaú. A moradia dos meus parentes era de porão habitável e fazia parede-meia com a do seu lado esquerdo. Eu adorava o bairro, com a praça provinciana, sempre deserta e seus dois cinemas. O modesto Tijuca e o grandioso América. (...) A casa dos Ennes era pintada dum róseo vivo e só me lembro dela como brasa dentro do dia claro ou recoberta de cinza, dentro da noite azul e violeta da Tijuca.

Suspiro.

Ali o adolescente Nava assistia à passagem, pela calçada da Santo Afonso, do poeta Emílio de Menezes ("já não o Emílio das cervejadas, dos trocadilhos, das quadrinhas").

Saudade.

Da casa não há o menor vestígio, como tampouco a que morou na Aristides Lobo (aqui). Em frente à Igreja de Santo Afonso (esta continua de pé, durinha, com seus excepcionais pisos de mosaicos registrados aqui), alguns prédios sem graça. Aliás o modesto Tijuca e o grandioso América transformaram-se em drogaria e em Igreja Universal. Mais do que uma pena, uma tragédia.

Para todos os efeitos, a Rua Major Ávila está literalmente eternizada pelo nosso maior memorialista. Dentro da noite azul e violeta da Tijuca, em pleno coração do Engenho Velho.

E se serve de consolo, ali resiste o restaurante Fernando's, sem self-service, sem comida a quilo, mas com sua feijoada de polvo e arroz de pato. Segundo Camila, o melhor arroz de pato da cidade, incluindo o do Adegão.

Thursday, February 23, 2017

Os jambeiros começaram de novo



Fui hoje ao Parque Lage imbuído do único propósito de ter com um jambeiro que eu avistara no dia anterior, de dentro do 439. Achei-o fácil e vi que o poema escrito para ele há cerca de um ano (aqui) continua válido e mesmo insuficiente: é preciso escrever mais. Aliás, encontrei outros oito e, de quebra, uma torre (aqui) e em seguida uma capela de macacos. Colhi uma flor e voltei para a última aula do dia. Enquanto os alunos resolviam questões de prefixos e sufixos, houve quem se encantasse por aquele pequeno milagre rosa.





A Torre do Parque Lage



Eu já estivera no parque Lage dezenas de vezes, mas nunca tinha visto esta torre. Sempre é tempo. Lembrei-me de imediato dos versos do Yeats, escritos na amargura da velhice, ainda mais por quem fora rejeitado por Maud Gonne e, depois, sua filha. Mas é amargura mesmo melancólica e de um caráter mais geral e indefinido e, quiçá, inevitável. Daquelas que também acometeram Bilac, como Carlos bem lembrou em "Dentaduras Duplas" :

"Dentaduras duplas:
dai-me enfim a calma
que Bilac não teve
para envelhecer."


Já os versos iniciais de Yeats, que me vieram à mente esta manhã quando fui ao Parque Lage em busca de jambeiros:


"What shall I do with this absurdity --
O heart, O troubled heart -- this caricature,
Decrepit age that has been tied to me
As to a dog's tail?"

Tuesday, February 21, 2017

Carta Marítima :: Soneto




Este foi o primeiro disco do Egberto que comprei, em 1985, vinil ainda. O Brasil vivia momento de euforia, tão tão diferente de agora. "Carta Marítima" fecha o lado A e sempre foi das minhas preferidas. Não do disco, da vida.

O que fiz agora foi inventar-lhe letra. Não que ela necessitasse.




esta carta marítima já sabe
que encontrará tuas mãos ao som da cítara
e estes acordes lancinantes sabem
à maresia e àquilo que é raiz
de nuvens : certa liquidez e dor.
Aqui o velho Atlas perde o nome
e friagem ao misturar-se ao velho Índico
que também seu nome perde, pois como
nomear esta água e esta luz
que nome Caravaggio lhes daria?
O claro chiaroscuro fantasia
arte e gozo de inenarrável rito
a carta é finda : e que horas são?
o relógio de sol marca infinito





Sunday, February 19, 2017

Crônicas Sul-Africanas XII :: Bo-Kaap



Estávamos na África, na África do Sul, mas às 4 da manhã, como na Turquia e em Marrocos, eu era acordado pelo muezim, porque estávamos em Bo-Kaap.

Não são poucas as mesquitas desse histórico bairro muçulmano, algumas do século XVIII. São casas muito coloridas, ruas de paralelepípedo, um céu muito azul, pedaços de chuva. 

Passaram asfalto em algumas ruas, rolou a inevitável gentrificação. Mas sempre se pode entrar nas mercearias para comprar água de rosas, pasta de tamarindo, masala, chicken tikka masala. Modo de trazer Bo-Kaap pro Grajaú.