Saturday, October 10, 2020

Uncle Walt, again


No dia 22 de setembro recebo whatsapp do meu pai pedindo que eu lhe traduza "I sit and look out upon all the sufferings of the world", do Whitman. Depois da contumaz procrastinação de dois dias, traduzo numa sentada só, não que fosse coisa mais simples, mas é que são apenas dez versos.

Tenho lá minhas desconfianças acerca do motivo do pedido do meu pai. Ele tem horror quando me ponho a falar de política. Mas se o poema estava em inglês... como ele sabia?

Em troca de mensagens (já lhe mandei a tradução), ele diz "Penso que em certas situações na vida nada mais resta do que observar, ouvir e silenciar", ao que replico "Sim, entendo. Walt Whitman acreditava que devemos dar voz àqueles que não têm. Por isso escreveu o poema". Ele responde imediatamente "Mais interessado fiquei no livro".

Uma paz se abate sobre a noite. Compro o Folhas da Relva e mando entregar lá em Copacabana.

 

I SIT and look out upon all the sorrows of the world, and upon all oppression and shame;

 

I hear secret convulsive sobs from young men, at anguish with themselves, remorseful after deeds done;

 

I see, in low life, the mother misused by her children, dying, neglected, gaunt, desperate;

 

I see the wife misused by her husband—I see the treacherous seducer of young women;

 

I mark the ranklings of jealousy and unrequited love, attempted to be hid—I see these sights on the earth;

         

I see the workings of battle, pestilence, tyranny—I see martyrs and prisoners;

 

I observe a famine at sea—I observe the sailors casting lots who shall be kill’d, to preserve the lives of the rest;

 

I observe the slights and degradations cast by arrogant persons upon laborers, the poor, and upon negroes, and the like;

 

All these—All the meanness and agony without end, I sitting, look out upon,

 

See, hear, and am silent.


 

Sento e vejo as tristezas do mundo, toda opressão e vergonha

Ouço soluços secretos e convulsivos dos jovens, angustiados consigo mesmos, cheios de remorsos

Vejo a mãe maltratada pelos filhos, morrendo, abandonada, descarnada, desesperada

Vejo nos baixios a esposa maltratada pelo marido – Vejo o traiçoeiro sedutor de jovens

Percebo as úlceras do ciúme e do amor não-correspondido, que tentam se ocultar – Vejo isso sobre a terra

Vejo os resultados da guerra, peste e tirania – Vejo mártires e prisioneiros;

Observo uma fome no mar – Vejo os marinheiros lançando alguns à morte, para preservar as vidas dos demais

Observo as durezas e degradações no trato dos arrogantes com os empregados, os pobres, os negros e semelhantes

Tudo isso – toda a maldade e agonia infinitas, eu, aqui sentado, vejo

Observo, ouço e me quedo em silêncio.

 

 

1 comment:

Unknown said...

Não conhecia. Agradeço pois é muito bonita.