Há soneto em Voo sem Pássaro (2012) que inventaria meus herdados do pai: perder-se na leitura, habitar espaços imaginados, errar sob a chuva, calçar sapatos velhos, improvável brilho verde no olhar e, por fim, o desacerto para (quase) todas atividades manuais.
Faltou o hábito da tunga, hábito tão arraigado que faz da média com pão e manteiga uma das refeições preferidas de todos os tempos. Lembro do pai dizer que tungaria mesmo em presença do presidente da República. Claro, pai, também eu tungaria em presença da Dilma, nossa última presidente / presidenta.
Aí descobre-se que o Dante também dá as suas tungadas. Assim do nada, ninguém ensinou.
O meu pai habitava os flamboyants
que já o habitavam bem antes que ele,
só, habitasse a casa em que as manhãs
vinham surpreendê-lo. Esse hábito --
o de perder-se na leitura -- herdei-o
bem como o de habitar espaços
que imagino e cultivo enquanto leio.
Dele também terá nascido o errar
sob a chuva, o calçar sapatos velhos
e improvável brilho verde no olhar
quando na face incide luz oblíqua.
Dele, por fim, o sem jeito das minhas
mãos: casa cheia de livro e o desespero
para abrir uma lata de sardinhas
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Na quinta-feira fria
O velho Dante tunga
O pão da padaria
No morno guaravita