Thursday, March 19, 2015

Leviathan ::: Não há mais juízes em Moscou



Não sei se conhecem a origem da expressão "Ainda há juízes em Berlim". Durante o seu reinado no século XVIII, Frederico II, rei da Prússia, decide construir um palácio de verão em Potsdam, próxima a Berlim, onde já existia um moinho de vento. Palácio construído e transcorridos anos, Frederico resolve ampliar seu castelo, sendo necessária para tal a demolição do moinho. O rei decide comprá-lo, mas o moleiro se recusa a vender, dizendo que não poderia se desfazer de sua casa, principalmente porque esta fora de seu pai e lá ele queria que seus filhos nascessem. O rei insiste, não deixando de adicionar que, se quisesse, poderia tomar sua propriedade à força, ao que o moleiro indignado lhe dá a célebre resposta: "Ainda há juízes em Berlim!...". Frederico, muito surpreso com a corajosa (ainda que ingênua) resposta, altera os seus planos, deixando moinho e moleiro em paz.

Gosto imenso da história no que ela representa uma almejada independência e imparcialidade da justiça, soberana e, perdoem a redundância, justa para pequenos e grandes.

Pois é exatamente o contrário disso que se vê no poderoso filme russo Leviathan, de Andrey Zvyagintsev, de 2014. Pode-se dizer que não é necessário assistir a um filme de mais de duas horas para se ver o contrário da expressão do moleiro, bastaria abrir jornais brasileiros. Pravda. Mas o filme é ainda mais que isso, tendo como intertextos o clássico de Hobbes do título e o Livro de Jó.

Com a figura de Putin no gabinete do prefeito corrupto e alcoólatra, é um ácido retrato da Rússia hodierna. Sem no entanto, limitar-se a ela, como já sugerimos no parágrafo acima.



PS :: A ação do filme não se dá em Moscou, mas numa distante cidade costeira do Mar de Barents, de não poucas baleias (presentes no cartaz do filme e em cena de grande dramaticidade). Usei Moscou aqui por três motivos :: metonímia da Rússia; pelo paralelismo com o provérbio (Berlim / Moscou) e pelo fato de a capital russa estar presente no filme na figura de um advogado cujas ações muito contribuem para o desenrolar do enredo.

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