Estou numa fase, digamos, muito chão. Isto é: agora que descobri a beleza dos azulejos / ladrilhos hidráulicos, vou à cata deles em antigas igrejas, botecos e lojas. Feita uma descoberta, curvo o pescoço em 90 graus, tirando fotos, esbarrando em tudo e em todos e só tornando a levantá-lo (o pescoço) quando deparo-me novamente com a claridade.
Assim foi na Igreja da Nossa Senhora do Carmo, nossa antiga Sé, quando lá estive numa quarta-feira para papar a missa de N. Senhora da Cabeça.
De lá rumei para a Igreja de N. Senhora do Rosário e S. Benedito, munido já da informação que, após o triste incêndio que a destruiu praticamente toda nos finais dos 60, só os azulejos hidráulicos da sacristia sobreviveram...
No caminho, ainda tinha a Casa Cavé, com mais deles...
Friday, December 30, 2011
Wednesday, December 28, 2011
Ufanices
Conheço um punhado de igrejas românicas europeias, estilo, aliás, que aprecio imenso.
Nenhuma, entanto, agrada-me tanto como esta. Chamem-na neo-românica, quasi-românica, pseudo-românica, whatever, é até hoje a única igreja românica que conheço, em todo o mundo, que pode ser contemplada ao som da sinfonia das cigarras. E à sombra do Pico do Papagaio.
Nem Monet teve isso em Rouen.
PS: Mas será mesmo românica? Ou bizantina? Lembram-se disto aqui?
Monday, December 26, 2011
Kombi Progressiva ou Pequena Antologia da Kombi
Odeio carros.
Farei, talvez, uma concessão às kombis, com a condição que, um dia, uma delas realize um meu sonho: levar-me ao México para assistir ao Baja Prog. Desde aqui, da minha porta no Ingá até Mexicali. A kombi será pintata com as cores do país-destino e ouviremos, claro, rock progressivo durante todo o trajeto, incluindo as paradas, à luz e ao bafo das estrelas.
PS: Como falar de rock progressivo e kombis e esquecer desta imagem, a perfeita síntese entre rock progressivo e kombis??
Friday, December 23, 2011
Rua Taturana
Então esbarro com uma rua que homenageia um dos personagens mais maravilhosos da nossa literatura -- o Riobaldo Tatarana.
Riobaldo tornou-se Tatarana depois, quando assumiu a chefia dos jagunços a tiros: "Ah, eu, meu nome era Tatarana."
Antes, foi Urutú-Branco, batizado por Zé Bebelo, ex-chefe: "Ah, o Urutú-Branco: assim é que você devia de se chamar."
Os nomes não pegam nele, o que o leva a refletir: "por meu tiro me respeitavam, quiseram por apelido em mim: primeiro Cerzidor, depois, Tatarana, lagarta-de-fogo. Mas firme não pegou. Em mim, apelido quase não pegava. Será: eu nunca esbarro pelo quieto, num feitio?"
Mas Riobaldo é o preferido dos companheiros, e também do Joca Ramiro, ainda que ele nunca deixe de ser Riobaldo. Nem poderia, rio baldo que é. Daí: Riobaldo Tatarana.
Mas a rua é Taturana, dirão. Dá no mesmo. "Tatá" ou "tatu", em tupi, significa fogo. Encontramos a palavra também em "Boitatá" / "Mboitatá", personagem de nosso folclore, cobra de fogo.
"Rana", em tupi", é "semelhante a", algo como o "like" em inglês, em "childlike", por exemplo. "Tatarana", pois, é "semelhante a fogo" e passou a designar aquela lagarta peluda que queima um bocado.
O sufixo "rana" Guima já o utilizara ao batizar seu primeiro livro de Sagarana, isto é, "à maneira de uma saga". "Saga" nada tem de tupi, é palavra nórdica, em que se pode reconhecer o verbo inglês "to say". Legal, né?
Ao mesclar tupi com dinamarquês, nosso cordisburguês dava mostras já do que aprontava. E de que aprontava. Mais moderno / eterno, impossível.
Porque nem toda rua há-de se chamar Rua Comendador Senador Trombogildo Pereira Júnior
Dando prosseguimento às postagens de ruas com nomes interessantes, que fogem às contumazes homenagens que nossos vereadores gostam de fazer a seus pares, ou seja, a corja de ladrões, estupradores e assassinos.
Quando os puxa-sacos de plantão decidem mudar o nome de uma rua aqui nesta cidade, sempre há chiadeira. Os bisnetos do Visconde Paraguassú se inflamam e relembram suas glórias imorredouras , as descendentes do Coronel Sacanagildo de Almeida Cavalcante batem o pé e rogam pragas, toda a árvore ginecológica do Dr. Onan Bronhoso da Fonseca gritam que isso é sacanagem!
Mas quem, quem defenderá quando (em breve?) decidirem pela mudança dos nomes da Rua Ierê e Tajuri?
Valei-me Tupã.
Mas nada do que tenho visto se equivale a esta... Rua do Z. Uma homenagem ao Zorro? Ou ao sono? =)
Thursday, December 15, 2011
Filho da Puta
Não haverá mais cavalo como aquele. Na primeira metade dos anos 60, precisamente nos anos de 62 e 63, Filho Puta reinou absoluto nas raias do Jóquei.
De todos os jóqueis que o montaram, Barrosinho, de Nova Russas, foi quem mais o compreendeu. Vê-los humilhar os colegas -- cavalos e jóqueis -- era não saber onde terminava o corpo de Barrosinho, onde começava o de Filho da Puta. O fato de Barrosinho medir 1,20 e pesar 40 quilos, o que lhe rendeu entre os colegas despeitados o apelido de Pigmeu, ajudava.
Nas festas que o dono de Filho da Puta promovia no jetset carioca, regadas a champagne e cocaína, Barrosinho proclamava fungando (ou aos soluços): "Esse cavalo não é apenas Filho da Puta, é também filho de uma égua!" Mas ninguém achava graça. Barrosinho, claro, não pertencia e não percebia ser títere. Nem o Filho da Puta.
Mas ganhavam e ganhavam e tudo eram champagne e alfafa fresquinhas. Multidões afluíam de todo o canto para gritar: "Corre, Filho da Puta" e, depois, na vitória, berrarem extasiadas "Filho da Puta! Filho da Puta!". Igual, nem no Maracanã. Tias e mães ouviam filhos e sobrinhos nessa gritaria e, impotentes, nada faziam: era o nome do cavalo.
Em seus lares, esses mesmos filhos e sobrinhos também cavalgavam empregados e empregadas (mesmo, e principalmente, quando chegvam aos 15,16 anos), agregados e agregadas, e chicoteando-lhes o lombo gritavam: "Corre, Filho da Puta!".
Até que um dia apareceu Esmeralda, por quem Filho da Puta caiu de amores. Como estes não eram platônicos, o cavalinho, em meio ao páreo, tinha ereções tão violentas que lhe impediam de correr. Qem acha que exagero, tente. E asssim começou seu declínio. Não havia viseira, tapa-olho, nada: Filho da Puta sentia Esmeralda pelo cheiro e já não terminava corrida.
Tentaram comprar Esmeralda, corredora apenas medíocre, mas seu dono, rival, declarou-a invendável. Barrosinho abandonou-o e em seguida seu dono que, numa festa já não tão badalada, declarou peremptório: "É um grandissíssimo Filho da Puta!".
Foi vendido, exilado em Paquetá, para puxar carroças. Durante a travessia, quem teve a chance de fitar Filho Puta nos olhos óleos entendeu o que realmente é tristeza.
Barrosinho virou garçom do Jóia, o Jóquei virou um imenso shopping center, o país, um matadouro. Seu ex-dono continua o mesmo. E passados alguns anos, quando já mal puxava carroças, Filho da Puta foi sacrificado e virou ração de cachorro.
Hoje é apenas um retrato na parede.
Mas como dói.
Monday, December 12, 2011
Corporal Clegg - Pink Floyd
Música pouco badalada do Pink Floyd, "Corporal Clegg" terá, no mínimo, o mérito de ser uma das primeiras composições antibélicas do Roger Waters. Não é pouco, e ainda tem mais.
A canção servirá com perfeição para ensinar o conceito "the form fits the content", um dos mais caros à literatura e que procuro aplicar quando trabalho canções com meu alunos literariamente.
Senão vejamos. O desdém imenso do narrador pelo militarismo não reside apenas nos versos (nosso personagem não perdeu uma perna na guerra, mas ganhou... uma de madeira; sua medalha foi encontrada no zoológico, e hoje os solitários Mr. e Mrs. Clegg encharcam-se de gim), mas na música em si -- a guitarra ácida, os vocais lisérgicos, o final tumultuado, a linda mudança de tempo e, principalmente, naquele irritante solo de kazoo. Toda a pompa militar que a Sra. Inglaterra sempre amou, plantando colônias e guerras por toda a extensão do globo, como que se reduz àquelas notas marciais estridentes, repetitivas e desagradáveis.
Consigo mesmo visualizar um vagabundo de chapéu coco marchando desengonçado, tentando acompanhar os soldados muito sérios. Ou o Pica-Pau. Todo o mundo do Mr. Clegg, o mundo no qual acreditou, é visto com suprema irrisão pela geração nascida nos 40, interessada em outros tipos de revoluções, mormente as musicais. "Corporal Clegg" poderia ser cantada em javanês, aliás, poderia ser instrumental, que essa crítica, por meios estritamente musicais, já estaria explícita.
By the way, o kazoo possui raríssimas ocorrências no rock, pelo que devemos todos ser gratos a São Vicelino (1080-1154), santo de hoje e de quem sou devoto.
E "coincidência" (epa, mas em literatura, em arte não existem coincidências), o primeiro kazoo foi fabricado por um relojoeiro alemão chamado ... Thaddeus Von Clegg! É a vida, sempre, que supera a arte.
Por que dois vídeos? O primeiro tem a canção completa, com direito a dois solos de kazoo, na verdade o mesmo tocado duas vezes. O segundo é uma rara versão live. Regalem-se as meninas com o Gilmour bonitão tocando o tal kazoo.
Wednesday, December 07, 2011
Três Conceições
Eis que Conceição, na toponímia carioca e fluminense, escande-se em três sílabas: uma rua, um morro, uma ilha.
Na Rua da Conceição, no centro do Rio, esquina com a Júlia Lopes de Almeida, está o botequim mais antigo da cidade em funcionamento: o Bar Jóia, extremamente antigo e supinamente elegante: fotos artísticas, Botafogo por todos os lados, música clássica como trilha-sonora, apenas dois ou três pratos no cardápio do dia. Quer mais, procura um chinês. Seu Jóia já nos deixou, mas Dona Alaíde toca o negócio pra frente com galhardia.
A ilha já não parece ilha, após os tantos aterros. O mesmo que aconteu com a Fiscal e com a das Cobras, no Rio. Mas a Ilha da Conceição está lá e o sentimento de que já foi ilha prova-o o certo isolamento que suas ruas ainda preservam.
O morro? Um dos lugares mais apaixonantes do Rio. Não espalhe ou faça-o somente para os de confiança. Há pouco teve evento de arte por lá e on the top of that apresentou-se a Orquestra Voadora. O rapaz tocando tuba, tão Fellini, não me deixa mentir.
Na Rua da Conceição, no centro do Rio, esquina com a Júlia Lopes de Almeida, está o botequim mais antigo da cidade em funcionamento: o Bar Jóia, extremamente antigo e supinamente elegante: fotos artísticas, Botafogo por todos os lados, música clássica como trilha-sonora, apenas dois ou três pratos no cardápio do dia. Quer mais, procura um chinês. Seu Jóia já nos deixou, mas Dona Alaíde toca o negócio pra frente com galhardia.
A ilha já não parece ilha, após os tantos aterros. O mesmo que aconteu com a Fiscal e com a das Cobras, no Rio. Mas a Ilha da Conceição está lá e o sentimento de que já foi ilha prova-o o certo isolamento que suas ruas ainda preservam.
O morro? Um dos lugares mais apaixonantes do Rio. Não espalhe ou faça-o somente para os de confiança. Há pouco teve evento de arte por lá e on the top of that apresentou-se a Orquestra Voadora. O rapaz tocando tuba, tão Fellini, não me deixa mentir.
Uma Conceição
Como hoje é dia de Nossa Senhora da Conceição, aquela que se equilibra sobre um quarto crescente, escrevo sobre a imagem que tenho.
É imagem barroca de madeira policromada, com suas volutas e panejamentos e furos de bicho. Ganhou-a meu padrasto, a quem sempre chamei de tio, das mãos de um antiquário, pelas fotos que fez para um seu livro. Se é autêntica, se já viveu centúrias, tenho minhas dúvidas, pois foi presente de antiquário e eu não confio nada nesse tipo de gente.
O valor que ela tem para mim é, usemos palavra tão em voga, agregado. Quando voltei de minha primeira viagem a Ouro Preto, que me marcou para sempre, percebi interessado a imagem da Nossa Senhora da Conceição na arca de meu tio. Percebendo, ele disse, de uma maneira tão desintressada, casual, tão matter-of-factly: "Quando você casar, eu dou ela pra você."
Passaram-se anos. Contra todas as probabilidades das casas de apostas londrinas, casei. No dia do casamento, quando Bia e eu abrimos nosso puxadinho em Pendotiba, o Orlando me entrega um pacote. Era a imagem da Nossa Senhora da Conceição, equilibrando-se sobre lua, anjos, nuvens e ternuras.
O Orlando, homem amoroso e difícil (a "Hard Lovin' Man", do Deep Purple, é dedicada a ele), era capaz de surpresas assim.
Tuesday, December 06, 2011
Viva o 1o Seminário Internacional do Bar Tradicional
Quando soube que em vez de coffee break, haveria chopp break, Bia falou que esse negócio não era sério. Mas é. E eu já cantara esta pedra por aqui, acerca deste Seminário que enfim acontece. Para os desavisados, que não se importam quando o bar-mercearia da esquina troca seus azulejos hidráulicos do piso por lajotas brancas, saibam que um encontro como este, que visa a discutir a preservação e existência de botequins tradicionais, é da maior importância, mormente se lembrarmos a quantidades de estabelecimentos fechados nos últimos anos.
De um tempo para cá, fecharam: Arco Teles, Bar do Garotinho, Flor do Leblon, Tangará, Pinhel, Monteiro, Café Progresso, Penafiel da Gamboa, Garoto das Flores, Bofetada, A Paulistinha, Leiteria Santana. Estes os que fecharam para sempre, subiram o telhado, foram pro céu dos botequins, mas ainda tem os que sofrem mortais descaracterizações, como a já mencionada troca de piso, a retirada de azulejos, de quadros, das geladeiras de madeiras, de serpentinas e, mesmo, claro, trocas de itens de cardápio. Em alguns casos, o fechamento talvez fosse preferível.
A discussão não é simples e não se dá só por aqui. Na minha opinião, não se trata de congelar e muito menos tornar os botequins macumba pra turista, com preços estratosféricos. Como a discussão não é simples, ao menos comecemo-la em caráter mais formal, porque decisões heroicas tomadas em mesas de botequim já temos a mancheias.
Aliás e a propósito, ontem mesmo a Prefeitura do Rio criou um "cadastro de bem cultural" com 12 botequins antigos, o que é uma espécie de tombamento informal.
Os bares selecionados são: Bar Lagoa, Nova Capela, Café Lamas, Bar Luiz, Armazém do Senado, Bar do Jóia, Bar do Gomes, Adega Flor de Coimbra, Restaurante 28, Casa Paladino, Bar Brasil e Cosmopolita.
Claro que faltaram muitos outros, mas já é um começo. Para lá de auspicioso.
Friday, December 02, 2011
Vou levar o meu filho a São Januário
O meu filho fará agora três anos: está quase entrando na idade em que deve começar a ser introduzido a alguns horríveis rituais machistas brasileiros, como o futebol.
Dia desses, pego nele pela calada e aí vamos nós para São Januário, apanhar a barca para a Praça XV que, com alguma sorte, não colidirá contra o cais nem nos deixará à deriva na baía.
Como ainda não sabe ler (um dia?), o primeiro gesto há-de ser o universal infantil de colar o rosto à janela aberta, qual cachorrinho em carro, para ver as águas e a terra distante que passam.
Começarei por lhe tentar nomear morros e picos e fortes da nossa boca banguela, o Cara de Cão ali, os Órgãos acolá, a Fortaleza de Santa Cruz. Terei que ter palavras para a ponte, que não lhe escapará. Sobre esta, aliás, vislumbraremos engarrafamento, mas disso está poupado o meu filho.
Da Praça XV pegaremos o 209. Ao cruzarmos a Leopoldina, tentarei persuadir-lhe como pode ser bonita, ainda que pesada, a estrutura da enorme Estação. Depois identificar-lhe-ei algumas ruas ao longo do caminho. Quando começar a chover, surgirão velhos edifícios e galpões e depósitos e trapiches abandonados, ruas tristes e carcomidas. Ele quererá saber o nome e o destino de cada prédio, de cada pessoa, e na sua cabeça de criança ficará guardada a mesma imagem que guardo da infância: um ônibus que atravessa rápido, como se em fuga, um mundo estático, feito de personagens de presépio que parecem plantados nos pontos, nas ruas, nos quintais das casas, com a única finalidade de nos olharem enquanto passamos.
Almoçaremos no Santa Genoveva, mas não sem antes, claro, traçarmos meia dúzia das impagáveis empadas da Dona Olímpia no Quinta de São Cristóvão, por sinal um dos templos da vascainidade desta cidade. Tentarei tirar uma foto da velha cozinheira minhota, o que muito o divertirá, já que ela, índia arredia, de tudo fará para não ter a alma capturada em meu Nokia.
Subiremos a pé a Rua São Januário, quando então irei falar-lhe do Policarpo e de minhas tentativas de localizar-lhe a casa. Meu filho tudo ouvirá, mas a esta altura um burburinho irá num crescendo inevitável penetrar em nossos ouvidos.
Lancharemos, numa barraquinha, cachorros-quentes Geneal, que isto aqui é jogo de futebol. Uma Coca-Cola para ele, um latão para mim. Dois pacotes de Biscoito Globo, bandeiras, e aí vamos nós, o coração descompassado ao ritmo do ruído surdo dos passos da multidão a caminho do Estádio, nosso Estádio, patrimônio mundial, glória neobarroca construída com o sangue dos portugueses e dos pretos e dos pardos pobres a quem tentaram humilhar e só fizeram fortalecer.
Das entranhas escuras desse monstro de cimento emergiremos para a luz ofuscante dos holofotes junto aos quais a chuva forma fios de prata brilhando na noite. Lá em baixo, o gramado, lindo, perfeito, parece esperar para ser pisado só por deuses, não por simples mortais. De repente, ele estremecerá, a sua mão apertará a minha, excitado e assustado, os olhos fixos na boca do túnel pela qual saem correndo, um a um, os onze deuses cruzmaltinos, saudados por um grito de vinte e cinco mil gargantas: "Vaaaaaas-coooo! Vaaaaaas-coooo!" Este é o instante mágico, o instante iniciático, que sela para sempre o amor irracional entre um homem e um clube de futebol, um amor para a vida, que ninguém, jamais, poderá alterar.
Esta iniciação é tarefa de homem, dever indeclinável de pai, que mulher alguma entende. Nem adianta depois tentar explicar: "Como é que é o futebol, mãe? Olha, cachorro quente amassado no bolso, uma multidão aos gritos, um gramado a brilhar, preto e branco e cruz de malta por todos os lados e nós, encharcados e roucos, patinando na lama." Enfim, uma paixão inexplicável.
PS: Possível que, no caminho, cruzemos com um e outro tricolor e botafoguense que, passado o impulso inicial de menear a cabeça, certamente entenderão este ritual de passagem e iniciação e sorrirão com simpatia.
PS: Este texto foi adaptado do belo texto de Miguel Sousa Tavares, "Vou levar o meu filho às Antas", de Não te deixarei morrer, David Crockett.
PS: Este texto foi adaptado do belo texto de Miguel Sousa Tavares, "Vou levar o meu filho às Antas", de Não te deixarei morrer, David Crockett.
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