Tuesday, November 22, 2016

Crônica da Casa Assassinada, de Lúcio Cardoso



Escrevi aqui sobre onde Lucio Cardoso começou  a escrever seu romance principal, a obra-prima da literatura brasileira que é Crônica da Casa Assassinada (1959), cuja leitura concluí numa noite de sábado de 92 e que, assim como aconteceria com A cidade e os Cães quase vinte anos depois, deixou-me uns minutos petrificado, olhos estatelados contra o branco da parede.

Ao lançar Taipa, em 94, foi da Casa que retirei a epígrafe:

que é o para sempre senão (...) a força enfim que modela esse que somos diariamente, mas o possível, o constantemente inatingido, que perseguimos como se acompanha o rastro de um amor que não se consegue, e que afinal é apenas a lembrança de um bem perdido -- quando? -- num lugar que ignoramos, mas cuja perda nos punge

Relendo-o agora, reencontrando as marcações que eu fizera, a sensação não difere muito. Relevando uma falha estrutural já apontada por Manuel Bandeira -- a de que todos os personagens, de carizes tão díspares quanto Nina e, digamos, o Padre Justino, têm a mesma voz --, a trama que aos poucos se constrói com os diários, cartas, narrações, confissões, depoimentos é, de fato, tão fascinante quanto perturbadora.

Impossível não traçar um paralelo com Lavoura Arcaica (1975), de Raduan Nassar: a força do patriarcalismo tradicional, que tenta manter-se de pé a todo custo, mesmo que corroído à exaustão em seu interior. Era preciso destruir os Meneses, pacto de morte firmado entre Nina e Timóteo e secretamente endossado por Lúcio Cardoso, que em entrevista disse que era preciso destruir Minas Gerais.

Toda uma literatura existencialista e psicológica, que não encontrou forma feliz num Octávio de Faria, tem aqui uma de suas expressões definitivas. 

Casa Léa Pentagna



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