A não ser confundido com seu homônimo em Tocantins, o Rio do Sono nasce no sul do município de João Pinheiro e deságua no Paracatu, na divisa com Buritizeiro, ali pertinho de Paredão de Minas. No Paredão, lugarejo perdido no gerais mineiros onde Diadorim morre ao cumprir sua missão (aqui), me banhei nele, neste rio de nome que sempre amei. Rio do Sono, repito em voz alta para evocar seu poder encantatório, como Rosa fazia ao dizer "Cordisburgo..."
Ainda: em suas margens, em lugar de nome Marcavão, Medeiro Vaz morre, e escolhe Riobaldo como seu sucessor
Parasse por ai e já estava muito bom, já valia visitas e banhos, mas no verbete "Rio Dormindo", Mestre Cascudo ensina que "Muito comum na Europa e Ásia a tradição de que os rios, entidades vivas, têm predileções e ódios, exercendo vinganças e doando prêmios a pessoas com as quais simpatizam. Há lendas referentes ao sono dos rios"
E prossegue: "Decorre dessa crendice a obrigação de despertar ou não o rio do seu sono ou acordar a água que dorme"
Wilson Lins escreve especificamente sobre o São Francisco:
Remeiro quando acorda de noite, se sente sede, não bebe água sem antes atirar um pedacinho de pau dentro do rio, para ver se o rio está dormindo. Se o rio estiver dormindo, o pau atirado na correnteza fica parado. Então o remeiro não bebe água, pois seria temerário acordar o rio, ou beber água dormindo. Segundo a crença popular, à meia-noite o rio dorme. Dorme pouco, dorme por um espaço de dois minutos, ou menos, mas o certo é que dorme. Durante o sono do rio, tudo para. (...) Acordar o rio faz mal, provoca castigos da mãe-d'água. Contam que um barqueiro novato, que não acreditava nas superstições do povo do rio, ficou louco, porque tomou banho à meia-noite, quando o rio estava dormindo. Dizem que enquanto o rio dorme, os peixes se deitam no fundo, e a mãe-d'água vem para fora, pentear os cabelos nas canoas, as cobras perdem o veneno, e os que morreram afogados saem do fundo do rio, rumo às estrelas
E como será o sono do Rio do Sono? E, melhor, seus sonhos?