É tão difícil falar (e ler e escrever) sobre música erudita russa (evito a palavra imperialista 'soviética') do século XX. Foi difícil até, mas na verdade deve-se dizer 'principalmente', para aqueles que a viveram / fizeram. Prokofiev descrever sua Quinta Sinfonia como "um hino para o Homem livre e feliz, para suas poderosas forças, e seu espírito puro e nobre" coloca-o em paz com a cartilha zhdanovista mas não descreve nada. Ou descreve, mas errado, umas palavras estéreis que podem até mesmo afastar quem esteja em busca de música moderna da primeira metade do século XX.
Sua Quinta Sinfonia é uma obra-prima, primus inter pares, mas não tem nada de hino feliz para o homem livre.
O movimento mais perfeito, de beleza estranha, seguirá sendo o Adagio. Ouvi umas vinte versões no Youtube. Minha preferida segue sendo a do Bernstein com a Filarmônica de Nova York, o primeiro vinil erudito que comprei, aos 16 anos. Mas esta não está nesta máquina do mundo que é o Youtube. Versões apressadas, que desrespeitam a "lenta cólica de um caracol", eu logo limava e nem ouvia até o fim. Se já tem o segundo e o quarto movimento para correr à vontade, indesculpável que se faça isso no Adagio.
Gostei imenso desta versão que posto.
O trecho do Adagio que vai de 33' a 33'40'' é a melhor ilustração do final de "A Legião Estrangeira", da Clarice : Ofélia se unindo, reunindo, à sua tribo de nômades do deserto. Na estepe contra os ventos, como os olhos cerrados pela areia. (Eu já falara um pouco aqui)
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