Pequi é fruto tão espinhoso que bota medo até no Riobaldo, o Tatarana, o Urutú-Branco (dentre outras postagens, aqui), que reúne forças tidas e não-tidas para matar o malvadão Hermógenes. Quem gosta dele é o Garanço, montesclarense cujas histórias servem como contraexemplo na arte de contar, pois tediosas. Em duas menções a ele no Grande Sertão, aparece associado ao pequi:
"Andei, em dei, até que lembrei: o Garanço. Bom, o Garanço, esse ia comigo, me seguia em tudo, era pobre homem à espera de qualquer ordem cordial. Isto ele mesmo nem sabia, mas era: que carecia era de alguma amizade. Estava lá, curvado, cabeçudo como uma cigarra. Estava cozinhando pequis, numa lata. – “Eh, eh, nós!...” – ele assim dizia. Ladeei conversa. Ele me ouvia, com anuídos, e fazendo uma cara de entender. Não conseguia."
"Mas eu não cheguei a falar, não quis, não expliquei nada. Que era que eu ia fazer, às fugas com aquele prascóvio, pelo sul e pelo norte, nos sertões da Jaíba? Ele só sabia cumprir obediência, no que eu riscasse, governado por meu querer e por minha idéia; um companheiro assim não aumentava segurança minha
nenhuma. Quero sombra? Quero eco? Quero cão? Não, com ele eu não me fazia, melhor esperar; eu iaficando. Desse no que desse; mais um tempo. Algum dia, podia Diadorim mudar de tenção. Em Diadorim era que eu pensava, de fugir junto com ele era que eu carecia; como o rio redobra. O Garanço se regalava
com os pequis, relando devagar nos dentes aquela polpa amarela enjoada. Aceitei não, daquilo não provo: por demais distraído que sou, sempre receei dar nos espinhos, craváveis em língua. – “Eh, eh, nós...” – o Garanço reproduzia, tão satisfeito. Minha amizade sobrou um pouco para ele, que era criatura de simples
coração. Digo ao senhor: naquele dia eu tardava, no meio de sozinha travessia."
Num texto lindo (pra ladear aqui com o Rosa, tinha que ser), Sérgio de Sá alertou na Piauí.
"É possível sentir, cheirar, tocar, lamber, chupar, apertar, sorver, se
lambuzar e se deleitar. Só não pode morder. Nunca. O perigo é grande. A
dor, indizível. Em torno do pequi a virilidade tem limites. Os
experientes avançam com desembaraço e precisão sobre a pequena
saliência. Os novatos progridem às apalpadelas, cheios de dedos,
assustadiços. É com cuidados infinitos que fazem uma pinça com o
indicador e o polegar e seguram o globo carnoso. Os sôfregos - ah, os
sôfregos. - eles não se agüentam. Com as mãos trêmulas, seguram o fruto
delicioso e dão-lhe uma dentada. Começa então o sofrimento, atroz. Parte
da emoção de comer pequi está no perigo de encontrar os minúsculos
espinhos que separam a polpa amarelo-ouro da branca semente."
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