Dante era ainda muito pequeno quando escrevi
um poema assim:
Dante
acorda
Um
cachorrinho cego
Fareja
o mundo.
Não tinha e não tenho a intenção / pretensão
que fosse um haikai, era apenas um poema de três versos. Tampouco sei direito o
que quis dizer com aquilo. Apenas, parafraseando o Bob, escrevi o que me
parecia correto.
De qualquer modo, não faz a menor diferença.
O que passa é que Dante, agora com seus nove
anos e já entrando, para meu silencioso desespero, na puberdade, pôs-se de fato
a farejar o prever chuvas, coisa que, dizem, cachorros muitas vezes fazem.
Na primeira vez estávamos eu e ele na piscina
quando apareceu amigo meu. Dante dizendo o tempo todo que choveria. Por gestos,
claro, que ele não fala a língua verbal articulada dos homens e tampouco a dos
anjos. Intrigado com aquela insistência, meu amigo perguntou o que ele estava
querendo dizer. Quando lhe respondi que era chuva, entreolhamo-nos e ele
sorriu: não havia nuvem no céu.
Menos de uma hora depois, o amigo tendo ido
fazer outra visita, no Leme, recebo dele mensagem: “Nossa! O Dante tinha razão!”.
Chuviscava, eu e Dante já secos e vestidos, contemplativos observando.
A segunda vez foi na pracinha, no
indefectível balanço. Ele feliz, porém ansioso, passando as mãos nos cabelos e
fazendo barulho de chuva. A mãe de um amiguinho também ela perguntou. A chuva veio em 15 minutos. Pegou a todos de
surpresa.
Quase todos.
Por fim, quarta-feira passada, quarta-feira
de cinzas – May the judgement not be too
heavy upon us --, estávamos no play brincando de bicicleta (mais brincando
que andando) quando os gestos começaram. Uma cigarra, rara no verão deste ano,
começou quase simultânea. Não chove,
velho – pensei.
A chuva veio de madrugada, na forma de
dilúvio bíblico. Quando Dante a farejou, às 18:42, ela ainda se engordava nas cabeceiras da Serra dos Pretos Forros.
Quem cantou a pedra errada foi a cigarra.
Sei que você não acredita em nada disso. Não
faz a menor diferença.
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