Ainda na ressaca das eleições, em cujo segundo turno envolvi-me intensamente, muito mais do que poderia crer e mais até que em 1989. Passados 25 anos, os protagonistas não mudaram grande cousa. O vencedor de então, o engomado Collor, devidamente defenestrado, encontrará sempre meios de se manter no poder, como a pulga não vive longe de qualquer pedaço de carne e músculos e sangue (principalmente) que se movimente. E não raro aquilo que ele representa toma corpo em outro candidato, como foi bem o caso neste 2014.
Nesta inevitável polarização que é um segundo turno, muitas coisas me chamaram a atenção, positiva e, principalmente, negativamente. Dentre estas, o alinhamento dos fãs de rock progressivo com a direita.
Não quero um mundo onde todos pensem igual, tampouco estou a dizer que só tomarei cerveja com quem goste de progressivo, seja vascaíno, leia poesia e goste de botequim velho. (E, claro, que a cerveja seja no mínimo a Heineken). Não se trata disso. Entendo mesmo que muitas vezes temos grupos distintos de amigos, formados a partir de interesses diferentes. Pode ser que haja a coincidência de alguns interesses, muitas vezes não há. Luna, a personagem que inventei, ia aos jogos do Vasco com a Andréia, mas suas conversas não iam muito além do que passava dentro das quatro linhas. Luna ia a shows de progressivo com o Mário, a Paulinha, a Guga onde, invariavelmente, conversavam sobre música.
O complicado não é quando a pessoa que também gosta de prog vota no João quando você vota no José. O complicado é quando, para além de votar no João, a pessoa ataca com virulência não só o José, mas os eleitores do José. Aí, como fica? E agora, José?
Ouvi de duas amigas / conhecidas dissabores semelhantes. Camila, uma ex-aluna muito politizada e também flamenguista bem marcada, descobriu horrorizada que muitos conhecidos seus flamenguistas são tremendamente reacionários. Já a Carolina é ativista dos direitos dos animais, sempre envolvida com questões práticas de adoção, vacinação, cuidados etc. Ela descobriu que muitas de suas colegas / amigas envolvidas nessa causa tinham pensamento político diferente do seu (até aí tudo bem), o qual faziam questão de expressar em termos ofensivos quando não criminosos.
E agora, Camila? E agora, Carolina?
Esperamos uma chuva forte em novembro que arraste as diferenças para o ralo, para debaixo do tapete, e seguimos cordiais com os nossos contatos? Haja amarelo para se colocar no sorriso.
E nem falei no progressivo. Nem falei que também eu descobri horrorizado que progressivo para muitos (a maioria?) fica restrito às notas do Moog e àquela bela introdução de Mellotron. Fora disso, porrada. A porrada do preconceito, a porrada da xenofobia, a porrada do pensamento hegemônico.
E o progressivo, rá, a cena italiana, a cena sueca, para citar duas das principais, era visceralmente de cariz democrático e de esquerda. Lembro-me dos versos de Yeats em "The Scholars" (1914), acerca dos acadêmicos velhinhos analisando os versos de Catulo, de todo esquecidos da paixão sanguínea na qual se queimara o genial poeta latino.
Sobre a linha esquerda-revolucionária dos rock progressivo dos anos 70, depois escrevo mais pormenorizadamente uma continuação.
THE SCHOLARS
W.B. Yeats
Bald heads forgetful of their sins,
Old, learned, respectable bald heads
Edit and annotate the lines
That young men, tossing on their beds,
Rhymed out in love’s despair
To flatter beauty’s ignorant ear.
All shuffle there; all cough in ink;
All wear the carpet with their shoes;
All think what other people think;
All know the man their neighbour knows.
Lord, what would they say
Did their Catullus walk that way?
O complicado não é quando a pessoa que também gosta de prog vota no João quando você vota no José. O complicado é quando, para além de votar no João, a pessoa ataca com virulência não só o José, mas os eleitores do José. Aí, como fica? E agora, José?
Ouvi de duas amigas / conhecidas dissabores semelhantes. Camila, uma ex-aluna muito politizada e também flamenguista bem marcada, descobriu horrorizada que muitos conhecidos seus flamenguistas são tremendamente reacionários. Já a Carolina é ativista dos direitos dos animais, sempre envolvida com questões práticas de adoção, vacinação, cuidados etc. Ela descobriu que muitas de suas colegas / amigas envolvidas nessa causa tinham pensamento político diferente do seu (até aí tudo bem), o qual faziam questão de expressar em termos ofensivos quando não criminosos.
E agora, Camila? E agora, Carolina?
Esperamos uma chuva forte em novembro que arraste as diferenças para o ralo, para debaixo do tapete, e seguimos cordiais com os nossos contatos? Haja amarelo para se colocar no sorriso.
E nem falei no progressivo. Nem falei que também eu descobri horrorizado que progressivo para muitos (a maioria?) fica restrito às notas do Moog e àquela bela introdução de Mellotron. Fora disso, porrada. A porrada do preconceito, a porrada da xenofobia, a porrada do pensamento hegemônico.
E o progressivo, rá, a cena italiana, a cena sueca, para citar duas das principais, era visceralmente de cariz democrático e de esquerda. Lembro-me dos versos de Yeats em "The Scholars" (1914), acerca dos acadêmicos velhinhos analisando os versos de Catulo, de todo esquecidos da paixão sanguínea na qual se queimara o genial poeta latino.
Sobre a linha esquerda-revolucionária dos rock progressivo dos anos 70, depois escrevo mais pormenorizadamente uma continuação.
THE SCHOLARS
W.B. Yeats
Bald heads forgetful of their sins,
Old, learned, respectable bald heads
Edit and annotate the lines
That young men, tossing on their beds,
Rhymed out in love’s despair
To flatter beauty’s ignorant ear.
All shuffle there; all cough in ink;
All wear the carpet with their shoes;
All think what other people think;
All know the man their neighbour knows.
Lord, what would they say
Did their Catullus walk that way?
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