Saturday, January 14, 2017

Crônicas Pirenopolinas III ::: Santa Dica



O nome parece bobo, trivial demais, quase coisa de sertanejo universitário: aí, vou te dar uma santa dica: prova esta breja aqui. Bem é isto também, e viva a ambiguidade. Mas o nome desta maravilha de cerveja artesanal de Pirenópolis, Goiás, vai muito além. 

Santa Dica (1903-1970) é a maneira como ficou conhecida Benedita Cipriano Gomes, nascida em um distrito de Pirenópolis e que liderou movimento messiânico. Uma espécie de Antônio Conselheiro feminina, com a vantagem de ter retornado da morte. Como dizia que a terra não tinha dono senão Deus e como atraía considerável legião de fiéis, despertou a ira dos coronéis da região, que responderam com o envio de tropas (igualzinho a Canudos, veem?). O ataque das tropas, no entanto, não foi muito bem-sucedido, pois as balas de metralhadora enrolavam-se nos cabelos de Benedita e caíam no chão, derrotadas. O Rio do Peixe foi por ela renomeado Rio Jordão, sobre o qual, dizem, ela gostava de caminhar. Editou jornal manuscrito intitulado A Estrela do Jordão Órgão dos Anjos, da Côrte de Santa Dica.

Não é pouco.

Com tal inspiração, Ernesto e Roberto produzem três cervejas de linda apresentação: uma de trigo (Hibisco), uma IPA e uma Kölsch. Quando estive na Rua do Lazer para tomar caldo de batata baroa e depois meu impagável risoto de pequi, acompanhei-os com a IPA. Senti-me o próprio curucucu. Quando visitei a fábrica, no dia seguinte, eles estavam brassando justamente a... IPA, de novo ela, puxa, que azar o meu, e dela bebi direto da teta da vaca, fresquíssima. Ótimo amargor, lupulagem equilibrada, grande frescor e notas cítricas no retrogosto. Para casa trouxe a Hibisco.

Em conversa com Roberto, ele me diz que em breve farão uma com cagaita, fruta típica do cerrado. A tal da cor local, muito comum entre as artesanais mundo afora. Aprecio, mas, tal qual em literatura, sem exageros. Mas se é pra usar fruto do cerrado, por que não o pequi (aqui e aqui), pergunto ao Roberto ansioso (eu, não ele), a que ele responde que se fizerem cerveja com pequi por ali, ele sai de perto. Rarrarrarrá. Pena.

De qualquer modo, espero voltar para tomar a de cagaita fresquíssima. Pirenópolis, aliás, já era cidade para se voltar sempre. Com a Santa Dica agora, nem falo.




















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