Não sei por quê, mas algo me dizia que aquela transversal da José Higino esconderia algum segredo, o que se revelou verdadeiro.
Partindo da Zé Higino em direção ao Uruguai, há do lado direito duas casas com paineis azulejares no quintal da frente. A primeira tem um de 48 peças, interessante pela sua relativa contenção :: paisagem bucólica de vegetação temperada, o velho escapismo de sempre. Com algum exagero, pode-se dizer mesmo que a vegetação verdadeira está ali para fazer certo trompe-l'œil com os azulejos.
Pouco mais adiante, numa mesma casa que infelizmente parece habitada apenas por gato gordo escondido sob banco também ele de azulejos (o banco, não o gato), dois maravilhosos paineis de 70 azulejos cada. Nada de contenção por aqui, mas o que Frederico Morais denomina, em Azulejaria Contemporânea no Brasil, "kitsch delirante". Em um dos paineis, um casal (ó, Marília bela!) faz juras d'amor eternas em ambiente tão outonal quanto medieval. As pastilhas cor vinho da parede não poderiam fazer moldura mais perfeita.
No outro painel temos aves tropicais sobre árvores ou no córrego. Mas reparem que a neve cobre o pico das montanhas do fundo, num evidente confronto de cor local com a onipresente paisagem europeia. Talvez se possa falar em indicador da origem do proprietário, se bem que, como sabemos, neve em Portugal só na Serra da Estrela. (Ou quem sabe, talvez o delírio do meu avô, ao mudar-se de Copacabana para a Tijuca, conforme relatei neste post aqui.)
O painel árcade é assinado por um Celino, que faz graça com as letras. É de supor que o das aves também seja seu.
PS: Morais, ao falar em "kitsch delirante", o faz em tom condescendente e paternal, fino crítico acadêmico que é. Eu amo o kitsch delirante de paineis assim e se pudesse nada mais fazia senão caçá-los por aí.
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