Tuesday, August 04, 2015

Crónicas Uruguayas V ::: Em Busca do Candombe



Escolhemos o Hotel Esplendor não apenas pela sua localização central, mas porque lá se hospedou Julio Cortázar em 1954, que chegou a utilizá-lo como cenário em seu conto "A porta interditada", conforme se lê neste post aqui.

Que a rua do hotel, a Calle Soriano, fosse a mesma do mítico Baar Fun Fun (assim mesmo, com dois as e com dois funs), só descobrimos in loco, para nosso júbilo. Porque, embora sejamos avessos a noitadas, o baar estava em nossos plaanos, principalmente depois que descobrimos que por lá também rolava, às sextas e sábados, ou seja, nos dias nobres, um candombe.

De modo que, depois de um sábado de 18 de julio (era Montevideo, num sábado, num feriado) que só não descambou para o tédio porque passamos a tarde (Lunimarg Delicatessen e Ramblas) com um casal de amigos, numa dessas coincidências que não existem, chegara o momento do Fun Fun.

Fizemos errado, chegando depois das 10, fila na porta, gente saindo pelo ladrão, mas a espera nem foi tão longa assim.

Ao entrarmos, nem um lugar para sentar no baar que parece inteiramente tomado por brasileiros. Depois de uma uvita tomada junto ao palco, e duas empanadas de lei, a garçonete, sem que houvéssemos pedido, nos consegue uma mesa colada ao minúsculo palco. A vida assim nos afeiçoa.

O bandoneonista e o violonista nos fazem felizes. Quando entra o cantor, começamos a desconfiar. Um tango aqui, uma milonga ali e dá-lhe Roberto Carlos, que a plateia é majoritariamente brasileña, cumpre agradá-la. Depois segue uma muito boa apresentação de tango, em que os dançarinos pareciam mais acrobatas que dançarinos. Até agora não sei como não levei um chute na cara, daquele pé que quase roçava o teto. Ou levei e não senti, anestesiado pelas Patrícias.

É chegada a hora do candombe. Minha conterrânea da mesa ao lado já perguntara à garçonete simpática "Vai ter candomblé?" O percussionista arma seu arsenal, onde não vislumbro um chico, um repique, um piano (el tambor más grande de registro más grave). Continuamos a desconfiar. No começo tudo bem, boas canções alegres, a galera vibra e nós continuamos a desconfiar, díos mio, é isso o candombe? Quando o grupo emenda um Michel Teló, para delírio da pátria brazuca empatriçada, descobrimos que podíamos pagar em real! O passaporte para a liberdade, a madrugada fresca e crocante da Calle Soriano vazia nos acolhe, desconfiadíssimos.

Se me disserem que o que vimos no Baar Fun Fun nas primeiras horas do 19 de julho de 2015 foi candombe, pode ser que eu acredite. Afinal, não fui em busca de uma essência, de um marco zero.

Mas meu coração prefere parafraser o desconfiado Carlos:

O candombe é no outro mundo. Este não é o candombe. E acaso existirão os candombeiros?

Ou o candombe é apenas uma pintura na parede?








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