A noite ateniense é uma
festa, em que pese a taxa de desemprego do país em 35% (ou por isso mesmo?).
Estivemos por duas vezes em tavernas com música ao vivo, mas apesar dos buzuquis,
saí com a nítida impressão de não ter ouvido nenhum rebétiko autêntico. Isso
menos frusta que alegra: é motivo certo para voltar.
Mas não regresso de mãos
vazias, pois trago CD dos mestres Bambakaris e Tsitsanis, reunindo gravações
que vão de 1936 (!) a 1979, com o foco na segunda metade dos anos 40, isto é,
exatamente os anos do pós-guerra.
Cito Lacarrière: “canto,
lamento e grito dos solitários, dos abandonados à própria sorte, dos
deserdados, mas também, frequentemente, dos rebeldes ou insubmissos, o rebétiko
ficará para sempre ignorado – e sobretudo recusado – pela sociedade
bem-pensante até a Segunda Guerra
Mundial. Permanecerá confinado em seu próprio meio, no interior das tabernas
características chamadas tekke ou dounia, onde as pessoas se entregavam ao
haxixe. (...) Assim, durante pelo menos meio século, os rebétika constituíram
um mundo paralelo, quase clandestino, que só imergiu do isolamento depois da
guerra.”
Eu diria que os rebétika não
imergiram de todo de seu mundo de sombras e será essa – a sombra – uma de suas
características. Nas tavernas em que estive rolava uma música mais palatável,
muito querida pelos locais, mas muito mais apolínea que, digamos, rebétika. E
motivos para que novos Bambakaris e Tsitsanis surjam (o desemprego, a
humilhação, o rebaixamento do AEK para a terceira divisão) não faltam.
Conquanto, claro, que o vinho resinado e quem sabe mesmo o narguilé de ervas
raras corram à larga.
Fiquem turistas rasos com as
apolíneas Acrópole e Ágora Antiga, em algum subúrbio, colateral à sua história
e aos seus mitos, algumas sombras emigradas, retornadas, reaparecerão, não como
Ulisses, mas como Orestes ou Agamemnon, para cumprir terríveis oráculos. Essas
profecias, ou os mesmos oráculos, repousam (inquietam-se) no seio dos rebétika.
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