Thursday, November 30, 2017

Ken Loach e o Brasil Pós-Golpe



Já foi dito que Bob Dylan atingiu o atemporal em "Blowin' in the Wind" quando deixou para trás canções que reportavam a contextos muito específicos, como "The Ballad of Donald White" e "The Death of Emmett Till", para tratar, poeticamente, de temas mais amplos com que indivíduos de diversas condições pudessem se identificar. Faz sentido. Mas creio ser possível tratar de contextos muito específicos e ainda assim dialogar com diversas pessoas em diversas situações e, assim, atingir a atemporalidade. É o que faz Ken Loach em Hidden Agenda (1990).

Ao tratar da guerra suja entre o IRA e o Estado Britânico na Irlanda do Norte, o filme expõe as vísceras de um aparelho absurdamente fascista no seio de um país considerado um dos faróis da democracia do mundo: a Inglaterra.

Uma das cenas de destaque, aparentemente de menor impacto, é aquela em que Harris, do IRA, tem encontro secreto com a ativista norte-americana, que recentemente teve o marido assassinado por grupo paramilitar que come na mão do governo, e com policial inglês que está ali para investigar tal assassinato. Didático, Harris explica-lhes como o estado de direito britânico desmantelou os partidos populares através da mídia e de perseguição implacável. Sim, a facínora Dama de Ferro por trás disso.

A ativista norte-americana, marido recém assassinado, tem sua epifania. O investigador inglês, por bem intencionado que seja, continua cego.

Nossa, isso é tão Brasil, isso é tão golpe de 2016, isso é tão organizações Globo, tão Folha, tão espanhol El País com seu discursinhos apenas aparentemente bem intencionados (existe corrupção dos dois lado, ai ai ai), isso é tão o mundo de milhões de patos lobotomizados que, ainda hoje, recusam-se a enxergar que mafiosos de terno e gravata são um milhão de vezes mais danosos e perversos que o cara que rouba a bicicleta ou o celular e que sequer admitem que houve golpe. E agora fecham os olhos para o absurdo retrocesso que vivemos.


Na esperança de que possamos celebrar a morte de Temer



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