Minha mãe foi Vovó Lelé mesmo com os dois primeiros netos, as idas a Teresópolis e a Miguel Pereira, as inesquecíveis festas no play, quando ficávamos altos e depois tínhamos que aguentar os reproches da família. (Mas eu não bebi tanto assim. Bebi, meu filho? Eu caí porque escorreguei, não tem nada a ver com a cerveja.)
Com o Dante ela já estava um bocado alquebrada, embora ela mesma tenha demorado a entender e aceitar isso. Já não tinha a força de antes, claro, e nem havia festas no play.
Com ela o envelhecimento foi assim: conservou-se absurdamente jovem até uns 68, 69. Depois a idade chegou e chegou sob a forma de um trator pesado.
Mas mesmo sem a força e as lelezices de outrora, e sem contar que o Dante demanda MUITO mais energia que uma criança que não tenha autismo, me lembro de uma postagem pequena que fiz no face ano passado, no dia 2 de abril, o dia mundial da conscientização do autismo, em que escrevi: "e à vovó Lourdes, incansável".
Porque apesar do trator, ela segurou uma barra do cacete. Os dificílimos dias e noites e madrugadas finais no Ingá, eu, Dante e ela, e os seis meses do ano passado em que Dante e eu acampamos em seu apartamento. Tive momentos de desespero, e ela então cuidava do Dante e de mim.
Durante os meses em que moraram juntos, Dante batia muito nela, para nossa grande tristeza. A psicóloga disse que isso acontece, a criança escolher alguém para saco de pancadas. Ela não deixava de o amar e acreditávamos que ele também a amava, à sua confusa maneira. A recompensa veio depois, ao sairmos, quando ele passou a dirigir-lhe os maiores carinhos. Era ela aparecer que ele chegava mesmo a me dar tchau, beijo, vai embora, me deixa agora com a minha avó.
Mesmo que ela não fizesse nada, não falasse nada, era a alegria mais pura porque ela estava perto, como mostram as duas últimas fotos. Literalmente as duas últimas fotos.
1 comment:
Um primor.
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