Releio com grande gosto Léxico Familiar, da Natalia Ginzburg, genial já desde o nome. Fique a ambiguidade da frase: geniais são o nome do romance e o nome da autora, Ginzburg, porque nos remete, também, ao seu filho Carlo, do inesquecível O Queijo e os Vermes.
Passados um pequeno prefácio (que ela chama de advertência) e cerca de vinte páginas, já antológicas e hilárias, Natalia assim nos entrega de bandeja o sentido (um dos) do título:
Somos cinco irmãos. Moramos em cidades diferentes, alguns de nós estão no exterior: e não nos correspondemos com frequência. Quando nos encontramos, podemos ser, um com o outro, indiferentes ou distraídos. Mas, entre nós, basta uma palavra. Basta uma palavra, uma frase: uma daquelas frases antigas, ouvidas e repetidas infinitas vezes, no tempo de nossa infância. Basta nos dizer: "Não viemos a Bergamo para nos divertir" ou "O que é que o ácido sulfídrico fede", para restabelecer de imediato nossas antigas relações, nossa infância e juventude, ligadas indissoluvelmente a essas frases, a essas palavras. Uma dessas frases ou palavras faria com que, nós irmãos, nos reconhecêssemos uns aos outros, na escuridão de uma gruta, entre milhões de pessoas. Essas frases são o nosso latim, o vocabulário de nossos tempos idos, são como os hieróglifos dos egípcios ou dos assírio-babilônicos, o testemunho de um núcleo vital que deixou de existir, mas que sobrevive em seus textos, salvos da fúria das águas, da corrupção do tempo. Essas frases são o fundamento de nossa unidade familiar, que subsistirá enquanto estivermos no mundo, recriando-se e ressuscitando nos mais diferentes pontos do planeta, quando um de nós disser -- Ilustre senhor Lipmann --, e logo ressoar em nossos ouvidos a voz impaciente de meu pai: -- Parem com essa história! Eu já ouvi isso mais de mil vezes!
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