Recebo convite para participar de uma comemoração do Dia Nacional da Luta Antimanicomial, mas não vou, eu não sou a favor do movimento antimanicomial. Sou a favor de que haja discussões, claro, mas assim, simples, ptooff, acabemos com manicômios? De jeito nenhum.
Escrevi aqui sobre maus tratos em instituições psiquiátricas. Mas isso não me fará advogar o fim dos manicômios, mas sim a sua melhoria. De modo análogo, quantos e quantos estragos a escola já não causou ao redor do mundo em séculos de existência? Quanta humilhação, quanta doutrinação, quanto castração, quanto bullying, para não falarmos em ações abertamente criminosas? Mas não se vê ninguém pregando o fim das escolas. Lutamos pela sua melhoria. Uma escola aberta, democrática, cidadã, intrigante, instigante, acolhedora, inclusiva.
Ferreira Gullar tem um filho esquizofrênico internado em uma fazenda em Pernambuco. Perguntem a ele o que acha do movimento antimanicomial, conversem com ele sobre o que é ter um filho esquizofrênico em casa. Os surtos. Eduardo Coutinho tinha um filho esquizofrênico em casa. Tinha. Foi assassinado por ele. Serão casos extremos, reconheço, mas sabe-se o que é aproximar-se da velhice, entrar na velhice, quando se passa a precisar de cuidados e ter que despender cuidados ainda maiores com o filho?
Percebo por detrás do movimento certa ingenuidade de base foucaultiana rasteira. A demonização do Estado. O Estado é sempre o Mal. Aliás, este mesmo Estado que mal cumpre seu papel para com a saúde física dos cidadãos e é praticamente nulo quando se trata de saúde mental, não vai amar essa história de acabar com os manicômios? Lavará as mãos. Me lembro do bufão Salazar exortando os portugueses a cuidarem de seus doentes... em casa!
Aliás, novamente, e claro que falo dos casos que realmente necessitam de institucionalização, quem ficará com os pacientes? A família?? Faz-me rir. A vida não é disneylândia. A família só se une e vê seu amor imorredouro crescer por aquele membro que necessita de tratamento especial no Globo Repórter, na voz marcante do Sérgio Chapelin. Falo de carteirinha. Embora eu tenha irmãos e sobrinhos, meu filho autista Dante praticamente não tem tios ou primos. Mesmo que eu já tenha apelado abertamente em seu favor.
Sou a favor de bons espaços de internação para casos agudos de pacientes mentais. Claro que Síndrome de Down, autismos moderados estão fora disso. O pobre do Arthur Miller teria que ficar com o seu filho com Down que internou e jamais quis ver a cara! Para os casos de esquizofrenia, de paranoia e tantos outros, cuidados, terapias, inclusão, carinho, espaço físico adequado. Profissionais bem preparados, estimulados e bem remunerados.
Utopia? Prefiro esta ao movimento antimanicomial.
1 comment:
Tenho que concordar. Estamos com um caso avançado da Alzheimer na família... pergunto-me se diante da omissão ( justificada ou não) dos filhos e netos é justo que o cônjuge idoso e já também frágil se sacrifique tanto. E o homecare é dispendioso e muitas vezes impossível. Enfim, é preciso ser realista.
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