Tuesday, October 25, 2011

Soneto só para a Letícia



Escreveu Bishop não ser difícil dominar a arte da perda, seja de uma chave, de uma hora, cidades, continente, pai. Acho esta arte dificílima e creio que jamais chegarei ao seu domínio, embora o passar dos anos tenda a nos ensinar algo neste sentido. À nossa revelia.

A arte do ganho, que aqui não é sinônimo de vitória, tem também seus mistérios e sutilezas. Ganhei coisas já, e não poucas: chaves, cidades, continentes. Pais e filho.

Outro dia, um soneto. Daquele modo clássico, dedicatória nominal sob o título. Eu já ganhara um conto, de modo análogo, mas quatorze versos assim... foi a vez primeira. O que fazer com o presente, para além de, criança, mostrá-lo a quem surgir pela frente? The art of receiving a sonnet is hard to master.

Pouco ou nada me resta senão retribuir.


SONETO SÓ PARA A LETÍCIA

Eu ganhei um soneto nesta quinta
E a manhã que se anunciava escura
Torna-se leda, tépida, sucinta
Própria da moça que tece canduras.

O tempo vem com suas imposturas
E o soneto, senhores, é arte extinta
A quem interessam rima e mesura?
Twitter e face não deixam que eu minta.

Mas se tenho um soneto, volto aos mitos
pretéritos, de paina, de blandícia,
de paciência e de esquecidos ritos.

E a minha alegria, ledícia, atice-a
sempre a moça de versos manuscritos.
E este soneto é só para a Letícia.

1 comment:

Nathalia said...

Descobrir o Evandro poeta tem sido uma feliz surpresa.